O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) solicitou abertura de inquérito civil público à Comissão de Dados Pessoais do Ministério Público do Distrito Federal para a apuração das informações encontradas na matéria da Folha de S. Paulo da última quinta-feira, 18, sobre empresas que estariam financiando envios em massa de mensagens de propaganda eleitoral por meio do WhatsApp, apoiando o candidato Jair Bolsonaro (PSL).

O encaminhamento da representação será para investigar três aspectos apresentados na matéria e que estão relacionados ao código de defesa do consumidor: como as empresas citadas na reportagem, que teriam sido responsáveis pelo disparo das mensagens, obtiveram dados pessoais para efetuar o envio automático; a apuração do indício de que funcionários de empresas de telecomunicações teriam vendido base de clientes a essas empresas; e, por fim, a denúncia de que a Havan teria usado a base de dados própria para efetuar os disparos.

Obtenção de dados pessoais

 Com relação à primeira indagação, o Idec desconfia que as empresas citadas – Yacows, SMS Market e Croc Services – teriam passado meses, ou o ano, comprando bases de dados de forma ilegal. “A gente viu que a Croc Services tem uma base capaz de fazer mais de 1 milhão de disparos por dia. Isso tem que ser apurado. Quais foram os métodos de obtenção desses dados para fazer o processamento desses dados? De acordo com a nova lei de proteção de dados pessoais, isso já é muito sério porque você tem que demonstrar com compliance que seu processamento de dados é lícito”, explica o advogado e líder do programa de direitos digitais do Idec, Rafael Zanatta.

Venda ilegal de dentro das telecoms

Sobre a segunda preocupação – indícios de que colaboradores de empresas de telecomunicações teriam vendido base de clientes –, Zanatta explica que o Idec pede ao MP que averigue essa questão, que seria uma violação de dados pessoais. “Evidentemente que esse é um problema criminal, a ser tratado numa esfera individual, do funcionário que fez esse repasse, e que também tem consequências trabalhistas, mas tem também uma dimensão de responsabilização da empresa. Ela está de acordo com a lei geral de telecomunicações. E, de acordo com o regulamento geral dos consumidores, ela tem uma obrigação jurídica muito forte, de dever de tutela, de cuidado com esses dados, incluindo os registros dos números de celulares, que é o identificador principal do WhatsApp”, explica o advogado. Caso a denúncia seja comprovada, será preciso iniciar um procedimento regulatório na Anatel.

Havan

Outro ponto noticiado pela reportagem da Folha de S. Paulo foi a denúncia de que a Havan teria usado base de dados própria para efetuar os disparos. A preocupação do Idec neste caso se refere ao fato de a loja de departamento ter agido de má-fé com seus consumidores. “A Havan, captando esses dados cadastrais de seus consumidores, e montando uma base de dados, nos termos do artigo 43 do código de defesa do consumidor, tem que ter boa-fé na sua relação com o consumidor, ou seja, de que esses dados serão usados apenas para manter a relação comercial com as pessoas – para informar promoção, para manter um canal aberto com o consumidor –, mas não para mandar mensagens de cunho político”, explica Zanatta.

Segundo o advogado, o escândalo revelado na última quinta-feira é um caso-teste para a nova lei de proteção de dados pessoais por envolver uma série de conceitos que estão na regulamentação combinados. “É um caso que nos permite refletir sobre essa amarração entre código de defesa do consumidor e lei de proteção de dados pessoais.”

O MP ainda não informou se irá ou não instaurar inquérito. Mas Zanatta espera que sim, devido à experiência do Ministério Público do Distrito Federal em inquéritos que envolvem proteção de dados pessoais, como o Cambridge Analytica, entre outros.

 

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