A escassez de espectro é um dos principais desafios para o 5G, mas iniciativas para o desenvolvimento de tecnologias de compartilhamento dinâmico tem empolgado a indústria. Durante a edição norte-americana da Mobile World Congress (MWC-19 Los Angeles), a competição Spectrum Collaboration Challenge (SC2) promovida pela agência norte-americana de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa (Defense Advanced Research Projects Agency, DARPA), teve como o grande vencedor uma solução que utiliza a inteligência artificial para gerenciar espectro e permitir a colaboração automatizada entre diferentes players em questão de segundos em uma interface de radiofrequência definida por software.
“Hoje, se você quer compartilhar espectro, precisa sentar e procurar que porção vai compartilhar e como será feito, colocando as regras em um pedaço de papel, o que leva anos”, declara a este noticiário o gerente líder de programação da SC2 na DARPA, Paul Tilghman, após participação em painel nesta quinta-feira, 2. “Tudo bem se quiser fazer isso uma vez, mas se precisar repetir várias vezes, é necessário a IA para chegar e encontrar essas regras. Foi o que vimos na noite passada.” Ele entende que o uso da inteligência artificial permite chegar a um compartilhamento dinâmico pleno de faixas, saindo de um processo que dura dias para algo em questão de “segundos, ou mesmo milissegundos, e eventualmente indo para a autonomia”.
O evento SC2 aconteceu na quarta-feira, 23, e teve como vencedor de um prêmio de US$ 2 milhões o grupo GatorWings, um time de pesquisadores da Universidade da Flórida. Na ocasião, foram utilizadas frequências médias. “Nós trabalhamos com ondas milimétricas, mas ontem tudo foi feito com frequências abaixo de 6 GHz, então funciona [também] com todos tipos de frequências omnidirecionais tradicionais”.
Para o futuro, Tilghman prevê o uso de IA para a gestão das mmWave com contexto de espaço, gerenciando o compartilhamento enquanto utiliza feixes direcionais. “Não é que os algoritmos não tenham aplicação espacial, é que não tínhamos como construir agora. Agora que temos plataformas no mundo real, claro que queremos ver como o compartilhamento dinâmico de espectro pode desbloquear o potencial disso. Tem uma grande oportunidade, com uso ainda mais intenso de IA.”, explica. Em faixas como de 24 GHz e 28 GHz, por exemplo, o representante da DARPA vê que a utilização de ângulos diferentes nos feixes poderá formar centenas de posições, o que aumenta a complexidade – o cenário ideal para aplicar a automação da inteligência artificial. “O futuro da IA com ondas milimétricas é brilhante.”
O diretor executivo de engenharia e tecnologia da Federal Communications Commission (FCC), Julius Knapp, diz que o órgão regulador norte-americano está atento às novas técnicas, mas que o uso da inteligência artificial promete uma revolução. “É um compartilhamento muito complexo, não é só listen before talk [‘ouvir antes de falar]”, compara. Ele ressalta também que isso traz novas formas de aplicação de políticas e regras, e que a FCC tem procurado maneiras de promover as condições para testes na indústria. “Para ser de vanguarda, precisa de um pouco de coragem.”
O vice-CIO em exercício da área de comando, controle, comunicações e capacidades de infraestrutura de comunicação (C4IIC) do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, Fred Moorefield, é taxativo: “Compartilhamento é difícil, e temos trabalhado forte para fazer isso. A forma correta é a parceria com a indústria e governo, sentando com as pessoas que desenvolvem equipamentos e operadoras”. Para ele, a necessidade do compartilhamento não é só dos EUA, e sim algo em escala global. “É sobre [quantidade de] dados, e isso não vai sumir, vai ficar pior”, diz. “Não vemos isso como um fardo, mas como uma oportunidade para inovar, investir e colaborar com todo mundo e em todo lugar.”
Ética e competição
Há uma possibilidade de impactos competitivos, contudo. “Operadoras móveis pagam muito dinheiro para ter espectro, mas aí elas podem ir e congestionar ao máximo possível”, sugere o diretor da área de pesquisas da Ericsson, Ali Khayrallah. “Parece simples, mas todas as peças têm de se encaixar para que eles possam querer investir.”
Paul Tilghman, da DARPA, ressalta ainda que poderia haver uma quantidade de informações liberadas entre operadoras, por exemplo, que poderiam se mostrar sensíveis – se determinada empresa teria mais ou menos acessos em uma certa área, por exemplo. E também poderia interferir na porção de espectro que uma empresa estaria disposta a compartilhar. “Temos que entender em que medida se pode otimiza – não ao dar todas as informações possíveis”, explica. “Esse tipo de informação pode trazer vantagem competitiva, então temos que ver o ganho desse tipo de dado.”
O vice-presidente de engenharia da Qualcomm Research, John Smee, sugere que a qualidade de serviço (QoS), indicadores (KPI) e elementos preventivos de gerenciamento devem ser usados para endereçar a questão. “Se é uma troca de informações livre, tem valor econômico e QoS, então tem de haver um relatório que, se for incorreto, teria penalidades. As regras vão definir globalmente como as redes e os KPIs serão.”