(Atualizada às 20:25) O valor pago entre as operadoras de telecomunicações referente ao uso da rede móvel (VU-M) pode aumentar cerca de 50% a partir do dia 24 de fevereiro. Isso levaria a um possível impacto nos preços ao consumidor para as chamadas para números de outras prestadoras ou chamadas de telefones fixos para móveis da ordem dos 30%, segundo cálculos a própria agência. A Anatel tinha a intenção de rever esse aumento esta semana, mas por conta de uma decisão liminar a revisão das regras que provocaram o reajuste está suspensa por pelo menos um mês.
A confusão começou em 2018, quando a Anatel publicou o Ato 9.919/2018, que estabeleceu os “Valores de Referência de VU-M (RVU-M) de Prestadora pertencente a Grupo com PMS no Mercado de Oferta de Interconexão em Redes Móveis”. Trata-se de um processo periódico da agência de cálculo dos valores de interconexão, que define quanto cada operadora paga ao realizar chamadas que terminam na rede da operadora concorrente. Em 2013 a Anatel começou a alterar as regras de interconexão, que eram muito mais vantajosas para as operadoras móveis, buscando equilibrar os valores e a tendência era que, entre as grandes operadoras, o saldo entre os valores pagos e recebidos se equiparasse. Mas em 2018, por uma série de circunstâncias específicas, os cálculos apontaram que em 2020 haveria um aumento de VU-M da ordem de quase 50%, saltando o valor de R$ 0,013 para cerca de R$ 0,019 o minuto. Pode parecer pouco, mas são bilhões de minutos a cada mês trafegados nas redes. O reajuste foi publicado em dezembro de 2018 e serviu de base para o planejamento das empresas.
Em 2019, por provocação da Claro, a Anatel refez os cálculos considerando dados mais atualizados, que consideraram a disseminação dos planos de voz ilimitados e a queda do chamado “efeito clube” no mercado (quando os usuários buscavam sempre manter suas ligações dentro da mesma operadora). Com isso, os novos cálculos apontaram para uma necessidade de reajuste muito menor da VU-M, de menos de 10% a partir de 2020. A área técnica da agência, então, levou ao conselho diretor uma proposta de edição de um novo ato, corrigindo as contas anteriores.
Este novo ato deveria ser votado esta semana, em circuito deliberativo, mas a TIM foi à Justiça alegando não ter tido acesso aos autos do processo que reviu as contas. A liminar do Juiz Bruno Anderson Santos da Silva, da Justiça Federal da Primeira Região (DF), entende que a operadora que provocou o pedido de recálculo (Claro) teve acesso aos autos e pode se manifestar, condição que deve ser dada também à TIM, segundo a decisão.
Previsibilidade
Segundo apurou este noticiário, a TIM alega em seu pedido que precisa entender a revisão das contas. Por não ter rede fixa, a TIM tende a ter uma receita maior de VU-M do que paga a outras operadoras, mas os valores, segundo apurou Teletime, seriam irrelevantes. O que a TIM questiona é o processo em que a mudança de cálculos foi feita, e não o resultado em si.
Existe, portanto, uma questão de fundo que é principiológica: o ato de reajuste da Anatel é um direcionamento conhecido com antecedência e seguido por todas as empresas em seus planejamentos. O entendimento de alguns atores do mercado que acompanham a polêmica é que, se a Anatel quer rever um ato ou propor outro modelo, deve fazê-lo com previsibilidade, o que não aconteceu neste caso, em que a revisão de contas aconteceu em novembro de 2019, para um ato que entraria em vigor em fevereiro seguinte. “Um sistema que muda as regras já aprovadas e planejadas há mais de um ano, de um dia para outro, de forma não transparente e imparcial, assusta os investidores”, diz uma fonte de mercado, destacando que o governo está justamente em um momento de promover a atração de investimentos, sobretudo no 5G.
Impactos
Os impactos do aumento tendem a ser mais sentidos pelas pequenas prestadoras, que não têm redes móveis, acabam tendo uma despesa proporcionalmente ainda maior de interconexão. A Oi, que tem grandes base de telefonia fixa e o menor market-share entre as móveis, também sente mais o peso de um reajuste, desfavoravelmente. Mas independente de quem ganha e quem perde, o aumento de tarifa de interconexão, na visão dos técnicos da agência, pode ter um impacto na oferta de planos ilimitados de voz e, certamente, de custo ao consumidor.
A Anatel, agora, tentará cassar a liminar e votar a revisão do ato que prevê o reajuste de interconexão, mas se não conseguir terá que esperar pelo menos 30 dias, que é o prazo dado à Justiça para a TIM entender as contas da agência.