| Publicada no Teletime | Em uma longa e dura reunião com o Tribunal de Contas da União (TCU) realizada nesta quinta-feira, 22, a Anatel começou a receber algumas indicações de como o tribunal recebeu o edital de 5G. Segundo apurou Teletime, o principal desafio será conseguir manter dois itens da política pública dentro do edital: a rede privativa para uso da administração pública e as obrigações de investimentos do Plano Amazônia Integrada e Sustentável (PAIS), a rede subfluvial de fibra óptica que será construída com recursos arrecadados na venda de 3,5 GHz.
Estes são os dois aspectos que o TCU indicou como os mais problemáticos, até agora. O Tribunal de Contas da União apontou à Anatel indícios de ilegalidade na inclusão destas obrigações. Ambos foram determinados pelo Ministério das Comunicações na Portaria 1.924/2021 e incluídos no edital aprovado pelo conselho diretor da Anatel.
Foi uma reunião importante por contar com o relator da matéria no TCU, Raimundo Carreiro, todos os técnicos da Seinfra (secretaria do TCU que analisa o edital) e representantes de todos os outros gabinetes dos ministros da corte de contas. Do lado da Anatel estavam todos os conselheiros e os técnicos diretamente envolvidos.
O TCU já vinha dando sinais de que os projetos PAIS e rede privativa seriam problemáticos. Foram os principais alvos de questionamento durante o evento fechado realizado no começo do mês, com muitas perguntas sobre o tema. Antes disso, haviam sido objeto de duas diligências do TCU para o Ministério das Comunicações, Anatel e Ministério da Economia.
O TCU cobra da Anatel e do MCom um detalhamento dos projetos do PAIS e da rede privativa. Quer saber como as redes serão construídas, operadas e mantidas, mas o Ministério das Comunicações apresentou apenas uma estimativa preliminar de custos, sem detalhar como será o processo de implementação.
Outro ponto que está sendo questionado pelo TCU é a adequação destas políticas à legislação orçamentária, uma vez que seria uma forma de burlar o teto de gastos e também uma tentativa de burlar as obrigações de licitar dos órgãos públicos. Pela proposta da Anatel, estas duas redes serão construídas pela EAF (Entidade Administradora da Faixa), uma entidade criada pelos vencedores do edital e que vai gerir um orçamento fixo para o cumprimentos das obrigações impostas para a faixa de 3,5 GHz, incluindo a migração da banda C para a Ku.
Nada do que foi dito na reunião com o TCU parece ser novidade nem para o Ministério das Comunicações nem para a Anatel. Segundo apurou Teletime, recados neste sentido já estavam sendo passados informalmente. O que chamou a atenção dos participantes da reunião foi o grau de maturidade do entendimento, já que o TCU parece convencido de que manter as metas de rede privativa e do PAIS dentro do edital de 5G seria mais do que um problema de operacionalização, mas um problema legal, o que torna a situação de difícil solução. O Tribunal indicou que recebeu da Secretaria do Tesouro do Ministério da Economia uma leitura parecida, condenando a inclusão destas políticas no edital.
Análise parcial
O TCU também já começou a analisar a precificação do edital feita pela Anatel, e também ai surgiram questionamentos sobre opções metodológicas. A agência deve ser diligenciada para que apresente as suas razões.
Mas o TCU informou que ainda não analisou todo o edital. Por exemplo, não apareceram ainda comentários sobre as obrigações de limpeza de espectro (migração para banda Ku e instalação de filtros para as estações profissionais de banda C). Aparentemente, esta primeira reunião foi no sentido de já dar celeridade ao processo e a oportunidade para que a agência avance nas respostas enquanto o tribunal analisa outros aspectos. Durante os períodos de diligência, os prazos do TCU são suspensos.
Consequências
Segundo fontes ouvidas por Teletime, caso a posição do TCU de fato se mostre intransponível quanto à legalidade das metas das redes privativas e do projeto PAIS, o governo terá que decidir se retira esses pontos do edital.
Isso poderia ter um efeito no viés não arrecadatório do leilão, mas há um porém: o texto aprovado pela Anatel prevê que em caso de sobras de recursos no cumprimento dos compromissos previstos, estes recursos devem virar novos compromissos. Isso é positivo para as operadoras, mas exigirá um tempo adicional de definição destas metas.
Outro ponto importante é que a rede privativa colocada no edital de 5G tinha como propósito, nas palavras do próprio ministro Fábio Faria, criar um “box” de rede, um ambiente no qual seria possível estabelecer condições mais rigorosas de segurança. O governo estabeleceu como regra que as empresas fornecedoras tivessem os mesmos níveis de governança do mercado acionário brasileiro. Era uma tentativa de criar uma rede sem a participação de fornecedores chineses sem com isso obrigar as redes comerciais a terem a mesma limitação. Sem a rede privativa, o risco de que o governo volte a pedir limites em redes comerciais pode crescer.
Outra alternativa é o governo colocar dinheiro na Telebras para que ela mesma construa a rede, como previsto no Decreto 9.612/2018. Conforme manifestação do presidente da estatal durante o evento do TCU, a Telebras já tem um levantamento detalhado de como seria esta rede privativa e quanto ela custaria (R$ 3,5 bilhões). O problema da Telebras é não ter recursos próprios para construí-la.
Já em relação à rede da Amazônia, seria necessário criar um mecanismo em que as próprias operadoras passassem a ser as proprietárias e detentoras das redes no futuro, mas mantendo o custo de operação em um ambiente altamente deficitário. Nesse sentido, seria necessário refazer o cálculo do leilão para saber se este modelo cabe no valor mínimo das frequências.