Um novo capítulo na disputa judicial entre Buser (Android, iOS) e as empresas de transporte rodoviário foi travada neste final de semana. O desembargador Nuncio Theophilo Neto, da 19ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), considerou que a plataforma não tem permissão para atuar no transporte de passageiros na cidade de Ubatuba, litoral norte de São Paulo.
“Não se olvida os princípios constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência, nem a necessidade de se preservar o direito do consumidor à contratação do serviço que lhe seja mais conveniente, mas não se pode permitir o exercício de atividade regulada por quem não tem a devida permissão, o que pode colocar em risco a própria segurança dos passageiros”, escreveu Theophilo Neto em sua decisão.
A ação contra a Buser foi movida pelas empresas Pássaro Marron e Alphaville, ambas associadas ao Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros no Estado de São Paulo (Setpesp). A organização sindical cita ainda outros processos que a Buser perdeu no passado, como ocorreu no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (via Tribunal Regional Federal da 4ª Região).
Em resposta ao Mobile Time, a Buser informou via assessoria de imprensa que recebeu “com surpresa” a decisão do TJSP e que pretende recorrer. Afirmou ainda que a 5ª Câmara de Direito Público do TJSP negou um pedido semelhante que buscava impedir que outras fretadoras atuassem por meio da plataforma. O mesmo TJSP manteve a decisão em favor da Buser quando julgou um recurso contra a decisão da 5ª Câmara.
Buser e Setpesp não informaram o número de processos que movem um contra o outro na Justiça.
Caraguatatuba
Outro palco de disputa entre Buser e as empresas tradicionais deste modal acontece em Caraguatatuba, também na região do litoral norte de São Paulo. A empresa de intermediação de viagens lembrou que a Justiça recusou um recurso semelhante da Pássaro Marron, que tentava impedir que empresas fretadoras realizassem viagens, em parceria com a Buser, com embarques e desembarques em Caraguatatuba, cidade vizinha a Ubatuba, no litoral norte de São Paulo.
Por sua vez, a Setpesp, que representa as empresas tradicionais do setor, disse a esta publicação que, diferentemente do que diz a Buser, não existe “vitória” no processo de Caraguatatuba. Explicam que em 23 de dezembro de 2021, o juiz Gilberto Alaby Soubihe Filho, do Plantão Judiciário de Caraguatatuba, negou um pedido de tutela de urgência em um processo que denuncia a atividade irregular da Buser. “Ou seja, ele se negou a antecipar qualquer decisão até que a vara local competente analise o caso”, respondeu a associação empresarial.
O advogado especializado em direito digital e sócio da Pellon de Lima Advogados, Rafael Pellon, explicou a Mobile Time que: a decisão da Justiça na cidade litorânea negou qualquer decisão liminar proibindo a Buser de embarcar os passageiros; agora, o processo segue e a Pássaro Marron vai poder apresentar provas e sua posição.
Pellon afirma ainda que a decisão de Caraguatatuba cita outra posição do TJSP (superior à vara de municipal) sobre o direito de a Buser poder trabalhar como intermediária dos fretados, desde que os ônibus estejam regularmente cadastrados nos órgãos de transporte do estado de São Paulo. “Ou seja, tem decisão do TJSP já tratando do direito da Buser trabalhar com o app fazendo a intermediação”, completou.
Entenda
A Buser foi criada em 2017 com o objetivo de ofertar fretamento coletivo para viagens intermunicipais e interestaduais de ônibus. Na época, o fundador da companhia, Marcelo Abritta, explicou ao Mobile Time que o modelo de negócios busca ajudar empresas de turismo e frete que ficam com os ônibus parados nos pátios, além de trazer mais comodidade e reduzir os custos de viagens para os usuários (até 70% de economia).
Em sua viagem inaugural, o ônibus fretado pela Buser não pôde prosseguir devido as regras da ANTT. Posteriormente, a companhia entrou com pedidos na Justiça e conseguiu operar. A plataforma cresceu com a alta demanda de usuários, recebeu aporte do SoftBank, e hoje atua em 120 cidades. Além disso, a companhia segue com o objetivo de ter 200 destinos cadastrados em sua plataforma.
Ainda assim, encontra resistência dos antigos operadores do setor rodoviário. Um desses exemplos foi a proibição da operação da Buser no Rio de Janeiro pela 10ª Vara Federal do Rio de Janeiro, em um pedido feito pelo Sindicato das Empresas de Transportes Rodoviários Intermunicipais.
No final de outubro de 2020, a disputa entre Buser e o regulador ganhou novo capítulo com a companhia processando um fiscal da ANTT em Minas Gerais. A startup alega que o profissional teve atitude ilegal e abusiva ao interromper uma viagem da JK Turismo com 22 passageiros. Por sua vez, a agência de transportes terrestres afirmou que todos os funcionários observam a legislação vigente e seguem os “princípios éticos que norteiam a administração federal”, fiscalizando de forma imparcial, independentemente se as empresas trabalham via app ou não. E para o feriado de finados, em 2 de novembro, a companhia operou sob o regime de liminar para não sofrer apreensões.
Em dezembro do mesmo, a Buser evitou a paralisação de suas atividades no estado de São Paulo em um processo aberto pelo Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de São Paulo (Setpesp) no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
Em janeiro de 2021, o governo do estado de Minas Gerais sancionou uma nova lei de transporte rodoviário favorável à operação de plataformas de intermediação, como a Buser. Entre as principais medidas do decreto estão:
– O fim da obrigatoriedade de informar a lista de passageiros 12 horas antes da viagem;
– E o término da necessidade de circuito fechado, ou seja, o ônibus não precisa mais voltar ao local de origem.
Mas em novembro de 2021 a Assembleia Legislativa de Minas Gerais aprovou uma lei que em teoria traz de volta o circuito fechado. Ainda assim, a companhia segue com um plano de investir R$ 100 milhões em MG.
No começo de 2022, a Buser chegou aos 6 milhões de usuários cadastrados em sua plataforma, um crescimento puxado pelas movimentações nas estradas na virada do ano.