| Publicada originalmente no Teletime | As operadoras de telecomunicações trouxeram para a Anatel uma ideia diferente de como criar um sistema para a identificação de chamadas de telemarketing e o bloqueio às práticas de “spoofing” (quando um usuário se identifica com um número que não é o seu). Em reunião realizada na semana passada na agência, e que se destinaria a sacramentar o modelo proposto pela Associação Brasileira de Telemarketing (ABT), por meio da solução stir/shaken, da Cleartech, as teles propuseram que o trabalho seja realizado agora pela ABR Telecom (Associação Brasileira de Recursos em Telecomunicações, formada pelas próprias operadoras), e que hoje cuida dos processos de integração entre diferentes empresas necessárias para roaming, portabilidade e outros temas.
A proposta foi recebida com um misto de ceticismo e alguma indignação pela Anatel, que já esperava encaminhar o problema por meio da ABTic, entidade que seria criada pela ABT para esse fim. Isso porque o modelo proposto do stir/shaken vem sendo discutido há oito meses, conta com um planejamento detalhado, modelo de financiamento (será bancado pelas empresas de telemarketing), proposta de governança e um cronograma negociado com a agência. Além disso, segundo fontes, faz cinco anos que a Anatel pressiona o setor de telecomunicações a encontrar uma solução contra o “spoofing”. Mesmo assim, a agência deu às operadoras 15 dias para se manifestarem sobre o modelo da ABT e espera que nesse período possam apresentar como seria o modelo da ABR Telecom. Segundo fontes da Anatel, qualquer modelo poderá ser aceito pela agência, desde que mantidas as mesmas premissas e prazos. A Anatel espera ter, ainda em 2023, o problema resolvido, para que em 2024 as chamadas possam ser autenticadas e identificadas, evitando uso abusivo das plataformas de telemarketing e práticas criminosas como spoofing.
Para as operadoras de telecomunicações, o que pesou contra a proposta da associação das empresas de telemarketing é que, mesmo que ela não tenha custo direto de contratação da solução, haveria um custo elevado de integração, não coberto. Além disso, existem várias questões de compliance interno, acesso a dados de clientes, legislação de proteção de dados e outros problemas operacionais que, no entendimento das teles, seriam demasiadamente complexos para serem resolvidos com uma nova entidade com as quais não têm relacionamento. Além disso, as teles querem ter maior controle sobre quem e como está sendo feito o gerenciamento das chamadas para provedores de valor adicionado, como as empresas de teleatendimento. No modelo desenhado por elas, a ABR Telecom contrataria o sistema (que pode ser a solução da Cleartech ou outra disponível no mercado), fará a integração com as teles e comercializará os serviços para as empresas de telemarketing. A relação entre operadoras e ABR Telecom tem mais de 20 anos e há um elevado grau de conhecimento mútuo das operações e da integração de sistemas necessária.
A Anatel está aberta a analisar as opções, mas não admite que o assunto se alongue por mais tempo do que já tomou. Para a agência, uma proposta tão tardia das operadoras pode atrasar o processo, mas entende que por já haver uma alternativa colocada na mesa, que é o modelo da Associação Brasileira de Telemarketing, não haverá margem para procrastinação. “É preciso dar transparência para as chamadas e é preciso resolver o problema do spoofing de numeração, e isso precisa ser resolvido esse ano ainda”, pondera um dirigente da agência.
Além da resistência das operadoras de telecomunicações em abrirem a identificação das chamadas por um novo ator, há ainda resistências ao modelo da Anatel de identificar chamadas de cobrança. No entendimento de algumas empresas que atuam no segmento, a identificação facilita a vida dos devedores. Uma das propostas colocadas para a Anatel é que se identifique apenas as chamadas conhecidas como ‘mar aberto'”, quando existe prospecção de clientes por meio de telemarketing, mas quando o contato for com usuários com os quais já haja relacionamento comercial, isso não precisaria passar por uma identificação.
Para a agência, contudo, o fato de alguém ter dívidas que precisam ser cobradas não pode ser um argumento para práticas abusivas de telemarketing. E no caso de chamadas identificadas das próprias operadoras, o usuário teria um incentivo ao saber quem é que está chamando.