A CEO e sócia-fundadora do Peck Advogados, Patrícia Peck, acredita que a regulação brasileira de inteligência artificial deve sair em novembro deste ano ou ficará para 2025. Com o texto atual do PL 2338/2023,mais similar ao modelo europeu com defesa dos direitos fundamentais, a especialista acredita que importar esse formato talvez não funcione.
Durante o Super Bots Experience 2024, evento organizado por Mobile Time nesta semana, Peck reforçou que uma legislação muito pesada gera susto e pode dar insegurança jurídica para a cadeia produtiva. Também afirmou que o problema não está na tecnologia em si, mas na mitigação da base de dados e treinamento da base de dados.
“Trazer a experiência europeia talvez não funcione no ‘terroir de dados’ brasileiro”, disse a advogada, ao lembrar que o País importa muitos modelos de IA de fora atualmente e precisa adaptar à realidade local.
Europa e Brasil na IA
Por sua vez, Flávia Lefèvre, integrante do Conselho Consultivo do Instituto NUPEF, afirmou que o ponto positivo do atual texto é a entrada da perspectiva sobre responsabilidade de danos individuais e coletivas com base no potencial de uso das tecnologias. Mas o ponto negativo é o fato de que o Brasil está atrasado no debate.
Lefèvre reforçou que o Brasil precisa trazer aprendizados da Europa, como definir os riscos devido ao alto potencial de discriminação e vieses no País e o Estado acompanhando de perto a governança em IA. Também pontua que é preciso ter assimetrias específicas, como sandbox.
Meio termo da IA
De acordo com o sócio do Pellon de Lima Advogados e consultor jurídico da I2AI, Rafael Pellon, o Brasil atualmente está no meio termo entre a regulação europeia e o arcabouço norte-americano em IA. Mas acredita que existam “outras formas de regular”. Também pede mais tempo para diálogo sobre o texto atual.
“Talvez não precisemos de 460 páginas como o texto europeu. Regular IA é como regular o ar. IA é uma feature, em tese funciona para tudo. Temos que focar menos no modelo europeu e mais naquilo que é importante para gente”, afirma o consultor. “Não é sobre regular ou não, mas como regular direito”, disse, ao lembrar que o Brasil também tem problemas de literacia digital – falta de conhecimento de tecnologias – no universo jurídico.
Para Pellon, uma visão de legislação de IA ex ante (antes de acontecer, ou seja, antes dos problemas) pode derrubar aplicações e possibilidades de crescimento de IA no Brasil com os desenvolvedores priorizando a segurança, se comparada com a post ante (aquela que corrige o rumo) que é um modelo mais leve.
“(O modelo) Ex ante pode derrubar aplicações e possibilidades, pois teria que travar o desenvolvimento pela segurança. A gente fica no paradoxo de observar outros países para alcançar um modelo nosso”, completou.
Problemas e acertos
Para Eduardo Paranhos, líder do grupo de trabalho de IA da Abes e sócio da banca EPG Advogados, o texto do PL é “crítico e restrito”. Deu como exemplo, o fato de o texto não separar modelos de alto risco de outros modelos (como a IA apenas para recreação) e a estrutura do projeto de lei ser similar à Lei Geral de Proteção de Dados, que pode gerar conflitos de interpretação no campo jurídico.
“Nesse momento que tem o avanço da tecnologia de inovação e a questão do tempo, nós precisamos entender o que precisa em uma legislação interventora contra outra que podia ser endereçada com outras legislações (existentes)”, disse Paranhos. “Qualquer problema que surgir com uma IA, do jeito que o PL está, vai para a justiça”, completou.
Por outro lado, o especialista reconhece que o documento proposto teve avanços em vários pontos, como o regime de responsabilidade que não sobrepõe o Código de Defesa do Consumidor e Código Civil.
Imagem principal: Patrícia Peck, CEO e sócia-fundadora do Peck Advogados (crédito: Marcos Mesquita/Mobile Time)