A Gerando Falcões, rede de ONGs que trabalha para combater a pobreza extrema em comunidades de várias partes do Brasil, usa a tecnologia para alcançar seus objetivos. Uma das formas é com o aplicativo Decolagem, usado internamente e que ajuda o representante da organização na favela a acompanhar as famílias que fazem parte do programa de emancipação social.
O programa Decolagem é uma tecnologia social criada pela própria Gerando Falcões e consiste em acompanhar famílias em comunidades onde a organização atua e que estão na pobreza extrema, ajudando a estabelecer trilhas e metas factíveis para cada membro dessa família a partir de escuta ativa e individualizada de modo que superem essa condição e recuperem a dignidade.
Seu aplicativo – desenvolvido pela organização com parceiros como Accenture e Zup, que trabalha pro bono para a ONG – reúne todas as etapas do projeto: coleta de dados, acompanhamento e cálculo do Índice Gerando Falcões, desenvolvido pela organização, para comparar favelas e os efeitos de suas ações naquele território – fazendo um antes e depois.
O app foi aprimorado e, agora, todas as etapas do processo estão ali. Até então, o diagnóstico era feito fora do app, depois migrava para o aplicativo e tirava as informações para calcular o índice em outro espaço.
“O aplicativo é o nosso banco de dados. Usamos ele para facilitar o trabalho do nosso profissional com as famílias, mas também para ter informações rápidas para poder acompanhar e tomar as melhores decisões e acompanhar com rapidez o quanto a gente está chegando perto da meta”, explica Nina Rentel, diretora de tecnologias sociais da Gerando Falcões, em conversa com Mobile Time.
Como funciona o Decolagem
O mentor da comunidade inicia o processo com o diagnóstico comunitário. São coletadas informações sobre aquela comunidade e se faz o georreferenciamento. Munidos de todas as informações necessárias, é calculado o Índice Gerando Falcões.
Passada a fase do diagnóstico – que é geral, para a favela – as famílias são cadastradas e o mentor comunitário consegue visualizar as informações básicas, mas também as respostas de uma conversa feita com cada família. Nessa conversa, são identificados sonhos dessas pessoas e são impostas metas para que eles alcancem seus objetivos.
“O sonho é algo positivo, algo que desperta uma esperança nas pessoas. Tem uma parte do app que é subjetiva dentro desse processo de superação da pobreza por cada uma dessas famílias, e a meta se ajusta a cada jornada de cada família. E, ali, conseguimos saber quantas visitas estão sendo feitas, quem consegue evoluir nas suas metas e assim por diante”, diz Rentel.
O acompanhamento das famílias acontece a cada três meses e as informações são atualizadas nessas visitas. E, com os novos dados, o app recalcula o Índice Gerando Falcões daquela família. As famílias são acompanhadas sob o foco de quatro itens do programa Decolagem, atualmente: geração de renda, direito à educação, primeira infância e autonomia da mulher.
“O mentor consegue ver na hora se aquela família está evoluindo pelo nosso índice ou não”.
Não à toa, o mentor é parte chave deste acompanhamento. “Existe um resgate de autoestima, de conversar, estar ao lado e fazer com que a família volte a ter esperança de que ela pode ter um futuro diferente do que ela está vivendo hoje. E com a tecnologia o mentor consegue ter o olhar para os dados e a gente, como organização, consegue recalcular a nossa rota a partir das análises e dos índices”, completa.
No final de um ano de trabalho é possível identificar o que funcionou e os próximos passos para aquela família. No entanto, quando existe alcoolismo, drogadição ou violência doméstica, os desafios são maiores.
A evolução das famílias
Aplicativo do Programa Decolagem. Foto: divulgação
O Programa Decolagem existe desde 2022 e está inserido no Favela 3D – de Digna, Digital e Desenvolvida –, projeto amplo que procura melhorar as comunidades e fazer uma transformação sistêmica com intervenção urbana, desenvolvimento social e econômico. Este ano, o Decolagem está sendo ampliado para além do Favela 3D.
Dez favelas inseridas no Favela 3D faziam parte do Decolagem. Atualmente, estão mais 15 favelas com o programa, totalizando 25 territórios atingidos pelo projeto. Ao todo, são 3 mil famílias, o que dá em torno de 12 a 15 mil pessoas impactadas pelo programa.
Em média, as famílias ficam em torno de 12 a 24 meses. As primeiras já atingiram a dignidade em favelas de Maceió, Rio de Janeiro, São José do Rio Preto e Ferraz de Vasconcelos/SP.
Atualmente, o programa consegue retirar 100% das famílias atendidas da extrema pobreza e em torno de 60%-70% atingem a dignidade ao longo desse tempo.
Escalas: extrema pobreza, pobreza e dignidade
O Programa Decolagem analisa as seguintes condições para classificar as famílias em extrema pobreza, pobreza e dignidade:
– se gera renda;
– se crianças estão fora da creche/escola;
– se há adultos analfabetos;
– se há muitas intercorrências de saúde geradas pela condição de pobreza extrema;
– se a família faz as refeições do dia;
– qual o estado da residência.
“Estamos olhando para o mínimo, o básico que as famílias precisam ter para saírem desta condição. Ajudamos via empreendedorismo, apoiamos com cursos, conexão com investimento semente, encaminhamos para o mercado de trabalho, fazendo capacitação técnica, conectamos a família no sistema de educação e de saúde; promovemos melhorias habitacionais, ajudamos a tirar os documentos, entre outros movimentos”, explica Nina.
E depois?
A família que atinge a meta sai do programa, mas continua na base de dados e é acompanhada, ou seja, mentores visitam a casa para uma avaliação. A ideia é entender se o Programa se sustenta a médio e longo prazo
Mais um app, Asmara, e outras ações da Gerando Falcões
A Gerando Falcões lançou recentemente um novo aplicativo para o projeto Asmara, de geração de renda para mulheres com revenda de produtos do bazar da ONG, entre outros. A expectativa é que, mais adiante, tudo seja unificado em um app. A ferramenta é usada para a realização das transações de vendas.
“O programa Decolagem é um processo de acompanhamento para todas as famílias. Asmara facilita o programa de geração de renda. O objetivo é ter tudo automatizado e conectado e que gere dados em tempo real”, resume.
Outro projeto da ONG é levar telemedicina para as favelas. Em parceria com o Fleury, foram instaladas cabines em algumas comunidades onde a Gerando Falcões atua. Elas contam com tecnologia do laboratório que conecta as famílias a um médico, que ajuda a fazer o acompanhamento de saúde básica das famílias e desafoga as unidades de saúde.
A ONG também levou rede Wi-Fi para as favelas, de modo que seus moradores pudessem acessar a Internet gratuitamente.
Há ainda educação de programadores e de letramento digital.
