É com muita satisfação que atendo o pedido do Mobile Time para voltar a comentar sobre o mercado de operadoras móveis virtuais (MVNOs).

Desde o meu primeiro artigo, há uns seis meses, duas coisas se intensificaram e acho que merecem que eu concentre meus comentários sobre elas.

A primeira diz respeito ao interesse de novos players para com o segmento.

Há seis meses, minha percepção sobre o interesse e mesmo sobre a viabilidade do segmento no Brasil era muito negativa. Vários projetos abandonados, muitas dificuldades.

Mas, para minha surpresa, de lá para cá houve um aumento significativo no nível de interesse de vários players novos lançando iniciativas no segmento.

De fato, minha percepção sobre os players estabelecidos há mais tempo não mudou: estão no geral muito decepcionados e aguardando a inclusão do MVNO na revisão do PGMC e a revisão dos preços das ofertas ORPA que foram aprovados há cerca de um ano em patamar irreal que inviabiliza o negócio para retomarem suas iniciativas de forma mais ambiciosa.

Credito o interesse dos novos players a dois fatores: 1) há uma percepção generalizada de que se você tem um canal de distribuição de algum produto ou serviço que permita a combinação com sinergias do esforço comercial para adicionar um outro produto/serviço (o chip SMP) você pode adicionar margem ao seu negocio; 2) a conscientização (tardia?) dos provedores de SCM de que precisam de uma oferta móvel para proteger sua base de assinantes do ataque do “dual-play” das grandes operadoras. E, além de proteger sua clientela, ainda adicionar uma margenzinha.

No último sábado fiquei preso aguardando por uns 20 minutos numa esteira de bagagens enquanto era bombardeado por uma propaganda da Vivo de bundle fibra+móvel!  Eles vão vir com tudo!

Acredito que com os preços atuais das ORPAS vai haver muita decepção com as margens adicionadas aos ISPs. Mas a provável revisão das ORPAS colocando os preços em patamares reais (compatíveis com a formula de “retail-minus” aplicada a preços REAIS praticados pelas operadoras (e não aqueles distorcidos que reportam à agência que até aqui os aceitava) pode salvar estas iniciativas.

Há ainda um outro componente que também pode estar influenciando positivamente esta agitação.

Toda a forte objeção que as operadoras vêm fazendo à inclusão do MVNO no PGMC tem como argumento principal de que seria desnecessário, dizem que o mercado já é bastante dinâmico, que há muitos players, que a Anatel não precisa atuar para fomentar a competição.

Claro que é tudo balela mas pode ser que, como forma de fortalecer a balela, as operadoras estejam sendo mais agressivas e baixando as barreiras de entrada para novas iniciativas. Faria muito sentido.

Além desta agitação que me surpreendeu há a evolução de um outro tema que se arrasta há quase dois anos e me causa muita preocupação como player deste mercado e dirigente de associação: a polêmica sobre se o  SMP pode ser prestado como se serviço de valor adicionado (SVA) fosse.

Esta questão vem sendo promovida por uma empresa (com 2 ou 3 cnpjs relacionados) que agiu com algumas secretarias de educação de certos estados para promover este que considero um formato cristalinamente irregular.

No entanto, passados já 19 meses de uma questionável e surpreendente cautelar concedida pela Anatel, a agência ainda não liquidou este tema que nunca poderia ter sobrevivido tanto tempo.

Agora os três processos gerados estão no Conselho da agência para uma decisão colegiada, que deve ser pronunciada em breve. E estou convicto que vai eliminar esta hipótese maluca e restabelecer a ordem regulatória que lhe cabe defender.

De fato, as últimas deliberações da Superintendência de Competição da Agência já apontam neste sentido. E não poderia ser diferente.

Ora, quem pode prestar SMP ou tem outorga de SMP ou é uma RV-SMP, uma operadora virtual. Qualquer cogitação diferente não tem o menor sentido.

Isto não quer dizer que uma empresa que explore serviços de SVA não pode contratar serviços de SMP. Pode sim! Mas não pode revendê-los!!

Há na agência reguladora uma série de deliberações do seu Conselho Diretor que determinam a proibição à revenda de serviços de telecomunicações e é precisamente isto que esta tal empresa está buscando, apesar de já ter sido alertada pela agência de que a única forma de fazê-lo seria se tornando uma MVNO.

Mas os últimos meses trouxeram também uma série de desapontamentos a quem defende o que nos parece claríssimo.

Em dois processos julgados no TCU a corte de contas fez um enorme desserviço ao setor.

Em um deles decidiu que, como os processos licitatórios objeto da denúncia não tinham gerado contratos (pelo temor gerado nos estados “patrocinadores” após as diligências do TCU em processo aberto para apurar denúncias destes casos), o caso deveria ser arquivado.

Ou seja: o TCU entende que em um processo suspeito que não tenha gerado contrato não há que se apurar ilícito!  Incrível!

Pior ainda: constatado que entretanto havia dois contratos em andamento com origens distintas daquelas apontadas na denúncia e tendo a área técnica recomendado explicitamente diligências rigorosas nestes dois contratos dado que, com base nas diligências realizadas, os dois contratos vêm sendo executados em desacordo com seus editais e termos de referência, a área técnica do TCU definiu que certamente os contratos não podem estar sendo executados de forma regular e que pagamentos por serviços não prestados quase certamente estão sendo feitos.

Já o senhor ministro relator não atendeu esta recomendação com a justificativa de que não havia notícia de reclamações das secretarias tomadoras dos serviços quanto a estas irregularidades.

Eu fico aqui pensando com minha vivência de TCU que vai ser curioso ver como o Tribunal vai seguir daqui em diante: quer dizer que contratos com execução suspeita e indícios de desvio de recursos públicos não merecem apuração se não houver reclamação do ente publico que pratica tais atos? Inacreditável.

Pelo menos neste processo o senhor Ministro se absteve de julgar o mérito do tema SVA, dado que o mesmo seria analisado em outro processo aberto pelo TCU por conta de um questionamento vindo do Congresso Nacional.

Só que também neste segundo processo um outro Ministro optou por também não julgar o mérito, preferindo aguardar uma decisão do Conselho Diretor da Anatel.

Neste momento acredito que a “tese” SVA está suficientemente fraca para causar danos ao setor e espero que a Anatel decida como esperado e de forma célere.

Claro que há um interesse comercial envolvido. Mas como dirigente setorial minha preocupação e motivação em combater esta distorção é a defesa de um modelo de negócios definido pela agência em 2010 e ao qual uma série de empreendimentos se apoiaram.

Caso contrário, todo o segmento MVNO deixa de fazer sentido:  se uma empresa puder comprar conectividade SMP e revendê-la sem licença ou supervisão da agência reguladora, o segmento morre.

E todas as decisões do CADE relativas às medidas compensatórias como condição para aprovar a venda da Oi perdem validade por vias indiretas. De que adianta preços ORPA aprovados/regulados pela agência se as operadoras puderem vender estes serviços a quem quiserem para revenda sem supervisão?

Se for assim, anulem a Resolução 550 de 2010!

Até a próxima.