Em sua resposta à Advocacia-Geral da União (AGU), a Meta informou que o programa de verificação de fatos e filtragem não será descontinuado no Brasil, mas reconheceu flexibilizações em suas políticas de conduta de ódio no Facebook, Instagram e Threads no Brasil.
De acordo com informações enviadas pelo órgão, o conglomerado afirmou que a mudança do fact-checking será apenas nos Estados Unidos, por ora. E que a alteração foi realizada em regime de testes com o Notas das Comunidades, o programa que substitui o fact-checking por comentários dos próprios usuários sobre as suas publicações.
O documento de quatro páginas da Meta que busca tranquilizar o governo brasileiro diz que a companhia respeita os direitos fundamentais e direitos humanos com base nos Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas.
Mas a holding confirmou que fez mudanças nas políticas de conduta de ódio. Na época, o CEO da empresa, Mark Zuckerberg, afirmou que as empresas contratadas para a checagem cometiam erros com mais frequência.
Eis a resposta completa da Meta.
Avaliação criteriosa
De acordo com a AGU, as mudanças e o posicionamento não estão adequados à legislação brasileira e contrariam manifestações recentes da Meta no julgamento do artigo 19 do Marco Civil da Internet no Supremo Tribunal Federal (STF). Com isso, o órgão pretende fazer uma plenária pública para avaliar os efeitos das mudanças nas políticas da holding.
“Diante de tal cenário, e considerando a confirmação pela Meta da mudança de sua Política de Conduta de Ódio no Brasil, iniciativa que tem potencial efetivo de permitir graves violações de direitos humanos no país, a AGU, em conjunto com os ministérios da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Direitos Humanos e Cidadania (MDHC) e Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR), realizarão ainda esta semana audiência pública para discutir os efeitos da nova política implementada pela Meta, o dever de cuidado das plataformas digitais, os riscos da substituição do Programa de Verificação de Fatos no exterior e as medidas a serem adotadas com o objetivo de assegurar o cumprimento da legislação nacional e a proteção de direitos”.
A reunião será feita na tarde da próxima quinta-feira, 16, em horário a ser definido e contará ainda com órgãos governamentais, sociedade civil, especialistas, acadêmicos e representantes das agências de checagem de informação.
Procurada pelo Mobile Time, a Meta não quis comentar.
Entenda
Após uma mudança no comando de sua vice-presidência de assuntos globais e uma guinada em alinhamento ao futuro governo do presidente Donald Trump nos Estados Unidos, a Meta decidiu pelo fim da checagem de conteúdo e filtragem no Facebook, Instagram e Threads, que tinha parceiros como Agence France-Presse (AFP) e Associated Press (AP), no último dia 7 de janeiro.
Em vídeo, Zuckerberg defendeu que a mudança visava dar mais flexibilização e liberdade de expressão a partir do modelo de “notas da comunidade” com os próprios usuários adicionando anotações a publicações para fornecer contextos adicionais ou esclarecer informações, sem intervenção direta de verificadores externos. Disse ainda que os checadores eram enviesados e que eram cometidos erros com frequência, além de censura.
A mudança foi criticada por especialistas e governos, como Brasil, França e a União Europeia, devido ao eventual risco de aumento do discurso de ódio e da desinformação com as fake news.
Após encontro com o governo francês e reunião ministerial no dia 9 de janeiro, a AGU encaminhou a notificação em um pedido feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com Rui Costa, ministro da Casa Civil, o presidente solicitou que a Advocacia-Geral da União questionasse a holding (que também controla o WhatsApp, mas este não está envolvido nas mudanças) para que ela se manifeste sobre o que fará no Brasil.
O órgão questionou o conglomerado sobre:
- Quais providências vem sendo e serão adotadas a respeito do dever de cuidado com relação à violência de gênero, proteção contra crianças e adolescentes, prevenção contra racismo, homofobia, transfobia, prevenção contra suicídio, discurso de ódio, entre outros temas;
- Se existe um novo canal para que as pessoas possam apresentar denúncias sobre eventuais violações dos direitos fundamentais diante das novas diretrizes que afrouxaram a verificação de desinformação nas plataformas digitais;
- Se continuará com o relatório de transparência sobre checagem de desinformação, dessa vez realizado por notas da comunidade;
- Se apresentará quem são os principais colaboradores das notas da comunidade, qual a porcentagem de participação cidadã, entre outros aspectos de modo que se demonstre a eficácia do novo método.
Outros impactos
Na reunião da última semana, Lula e seus ministros também anunciaram a criação de um grupo de trabalho com participação de vários ministérios. A ideia é que o GT dialogue com o Congresso Nacional e o Judiciário. No caso do Congresso, circula o PL das Fake News, que está parado, e, no STF, acontece o julgamento sobre a responsabilização das plataformas digitais com a discussão sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet.
Vale lembrar, um outro ofício do Ministério Público Federal de São Paulo (MPF-SP) pede para a Meta detalhar se as mudanças impactam o País e quais medidas serão tomadas para garantir que a desinformação não prolifere na plataforma. A partir dessas, o MPF-SP vai decidir se a Meta pode ou não atuar no Brasil. Enviado no dia 8 de janeiro, a Meta tem 30 dias para responder aos procuradores federais.
Paralelamente, a Meta anunciou internamente o fim de seu programa de desigualdade, equidade e inclusão (DEI) em mais uma aproximação à vindoura administração de Trump. O presidente-eleito dos EUA assume a Casa Branca a partir do próximo dia 20 de janeiro.
Imagem principal: Ilustração produzida por Mobile Time com IA