O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, marcou o julgamento virtual sobre o compartilhamento de torres para o período de 7 a 14 de março. O ministro é autor do pedido de vistas que suspendeu a deliberação no ano passado. Desde então, o tema ganhou novas camadas, com um acúmulo de pedidos de manifestações no processo, sendo a maioria delas relacionadas ao ingresso de associações de municípios que fazem um contraponto aos argumentos das grandes teles.

O tema é analisado na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7708, na qual a autora, Abrintel (Associação Brasileira de Infraestrutura para Telecomunicações), obteve uma liminar em setembro do ano passado que implicou na retomada do regime de compartilhamento obrigatório de torres de telecomunicações quando se tratar de distâncias inferiores a 500 metros entre si. A decisão cautelar, emitida individualmente pelo ministro Flávio Dino, foi submetida no mesmo mês à avaliação coletiva, no plenário virtual, quando então Barroso pediu vistas.

Na prática, a liminar restabelece o regime de compartilhamento que havia sido flexibilizado a partir de uma mudança na legislação em 2021 (Lei nº 14.173/2021) e que divide opiniões.

De um lado, as grandes teles – representadas pela Conexis – entendem que a flexibilização é necessária para o avanço do 5G no país. Do outro, a autora, Abrintel, associações de municípios e parte dos pequenos provedores argumentam que a flexibilização provoca a duplicação de infraestrutura que poderia ser compartilhada, com impactos ao meio ambiente e ao planejamento urbano.

Entenda o caso

Ao entrar com o processo, em agosto do ano passado, a Abrintel alegou que a determinação de obrigatoriedade do compartilhamento de torres com a chamada “regra dos 500 metros”,  “além de refletir um dos fundamentos sobre os quais se organizaram e se organizam os serviços de telecomunicações no Brasil desde a abertura desse mercado […], gerava uma série de consequências sociais, econômicas e ambientais positivas, notadamente relacionadas à otimização e ao uso eficiente de infraestruturas, sendo prática fundamental à expansão das redes de telecomunicações, por gerar incentivos ao compartilhamento”.

Os argumentos pela retomada do regime, no entanto, não se limitam aos impactos da medida em si. A Abrintel argumenta que a flexibilização se deu a partir de uma emenda “jabuti”, inserida em uma Medida Provisória (MP 1.018/2020), posteriormente convertida em lei, que tinha como objetivo original tratar da redução de taxas setoriais. Esse é um dos pontos que compõem a análise de Dino ao emitir a liminar.

“A emenda parlamentar, no entanto, longe de envolver tributação, modifica profundamente o modelo de exploração dos serviços de telecomunicações, vigente há muitos anos. Desse modo, considerando que o compartilhamento de infraestruturas traduz assunto de máximo relevo para os sistemas de telecomunicações, entendo plausível que a radical modificação operada no setor das telecomunicações, mediante aparente ‘emenda jabuti’, tenha ocorrido com possível prejuízo ao devido processo legislativo e ao princípio democrático, nos termos da jurisprudência desta Casa [STF]”, afirmou Dino na decisão liminar.

Outra questão que contou para a decisão é que a flexibilização do compartilhamento de torres, por tratar de alteração dos sistemas de telecomunicações, não poderia ser um tema oriundo de uma Medida Provisória.

Para além das questões acerca da forma de construção da regra, o ministro também acatou as observações acerca dos impactos urbanos. “Caso mantida a norma impugnada, além de suprimir um regime de compartilhamento que a política nacional busca incentivar, tem o potencial, ainda, de acarretar a multiplicação das infraestruturas de solo, causando graves impactos urbanísticos, paisagísticos e ambientais nos centros urbanos e no campo”, concluiu o relator.

Compartilhamento de torres: Conexis, Abrintel e TelComp

STF; compartilhamento de torres

Foto: Nelson Jr./SCO/STF

O julgamento será retomado em março a partir de novas perspectivas. Quando o tema foi colocado em discussão no plenário virtual, em setembro do ano passado, Dino ainda não havia aprovado o ingresso da Conexis para se manifestar oficialmente (amicus curiae), o que só ocorreu em dezembro do ano passado.

A Conexis entende que há uma “distorção” promovida pela Abrintel. O principal argumento é o de que a política de compartilhamento de infraestruturas não foi completamente extinto. “A única alteração que a revogação tardiamente combatida nestes autos pela Abrintel promoveu foi a eliminação da regra de distanciamento mínimo de 500 metros entre torres previsto na norma revogada, a qual foi desenhada, à época, para as tecnologias 2G e 3G, portanto, num estágio anterior de avanço tecnológico”, afirmou.

A associação de operadoras também chamou atenção para informações apresentadas por outros representantes do Estado, que já se posicionaram contra os argumentos da liminar, entre eles, a Consultoria Jurídica do Ministério das Comunicações.

Ainda em outubro, uma nota técnica do órgão ao Supremo afirma que “não houve a abolição da obrigação legal de compartilhamento de infraestrutura” com a emenda em questão, pois a Lei Geral das Antenas “assegura a garantia de compartilhamento da capacidade excedente da infraestrutura de suporte, de forma onerosa para quaisquer terceiros interessados”.

A Abrintel, por sua vez, apresentou novas informações ao STF no início deste mês, entre elas, um estudo técnico do instituto IPE Digital, que demonstra, como sintetiza a associação, “que o 5G vem sendo implantado com sucesso no país sem a necessidade de construção de novas torres de grande porte” e “isso se deve ao fato de que 87% das estações rádio base 5G instaladas no Brasil reutilizam estruturas anteriormente instaladas, confirmando a relevância do compartilhamento de infraestruturas”.

A Conexis já rebateu este ponto em nova manifestação, encaminhada na última semana. ” […] chega a ser óbvio, podendo ser intuído até mesmo por um leigo, que, num primeiro momento, as operadoras buscaram aproveitar as infraestruturas já existentes para instalar as antenas da tecnologia 5G em prol da economia e sustentabilidade da rede. Disso não decorre jamais a conclusão de que não será necessária a instalação de outras novas infraestruturas de suporte, inclusive, torres, para que o 5G atinja, já em 2030, os ambiciosos planos de cobertura do Governo Federal e das operadoras, promovendo a verdadeira revolução tecnológica que impactará a vida de centenas de milhões de brasileiros”, retrucou.

Há ainda outras manifestações e pedidos de ingresso no processo. Entre elas, a TelComp, que representa provedores de médio e pequeno porte, favoráveis ao compartilhamento de torres com a regra dos 500 metros, chamando atenção para impactos concorrenciais.

“A obrigatoriedade de compartilhamento de infraestrutura, anteriormente prevista, funcionava como um mecanismo de incentivo à livre concorrência, permitindo que prestadoras menores tivessem acesso à infraestrutura essencial sem a necessidade de realizar altos investimentos iniciais. Com a revogação desse dispositivo, cria-se um ambiente desfavorável à livre concorrência, favorecendo grandes operadoras que detêm recursos para construir infraestrutura própria. Isso pode gerar um desequilíbrio competitivo e dificultar a entrada e a permanência de novos players no mercado”, argumenta ao STF.

Há ainda petições de 14 associações de municípios (uma nacional e representantes do Acre, Goiás, Paraíba, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Maranhão, Rondônia, Pará, Espírito Santo e Ceará, além de localidades do entorno de Brasília), que querem opinar principalmente sobre os impactos urbanos na ausência da regra de 500 metros.

Imagem principal: Ilustração gerada por IA pelo Mobile Time.

 

*********************************

Receba gratuitamente a newsletter do Mobile Time e fique bem informado sobre tecnologia móvel e negócios. Cadastre-se aqui!