Desde meu mestrado sobre os dispositivos móveis lá pelos idos de 2005, muito tem se falado sobre os aparelhos vestíveis (wearables).
Objetos como relógios, jaquetas, tênis e óculos sempre se misturavam com uma potencial internet das coisas ubíqua. Esse cenário criava um mundo meio “neuromancer” na imaginação dos pesquisadores e dos profissionais de mídia digital.
Mas, claro, “visão sem execução é alucinação”. Naquela época, tudo era ficção. Foi preciso quase duas décadas para a Apple lançar um visor (aquilo é óculos?), que tem impressionado muitos usuários. Movimento feito depois de produtos consistentes como AppleWatch e AppleTV (que não é vestível, mas extrapolou o iPhone). Essa novidade sugere que o dispositivo pode virar um padrão de tecnologia vestível bem adotado pelos consumidores.
Mas, para chegar nesse ponto, tentativas como Google Glass ou o relógio Pebble foram frustradas. Como são, aliás, muitos dos movimentos pioneiros da indústria de tecnologia de comunicação em massa.
Por isso – e aí que vem o ponto central do meu artigo – a gente precisa ter visão para entender o que está acontecendo. Pois, apesar da novidade, nada muda de forma radical (usando o termo no sentido de “raiz”).
A plataforma continua digital e móvel. As pessoas vão ter que comprar, se relacionar, ler notícias, buscar entretenimento. A rede digital vigora firme e forte, assim como foi o telégrafo no século XX. Óculos e outros vestíveis são aplicações originadas de um padrão técnico pré-estabelecido.
Claro que as tecnologias vestíveis vão abrir muitas possibilidades de novos formatos. Mas dentro de uma lógica que conhecemos desde os anos 90, com a escalada do protocolo WWW concebido pelo genial Tim Berners-Lee e a turma do CERN.
Portanto, vamos aproveitar o lançamento do Vison Pro para refinar nossa visão. Você pode ser um early adopter no nível pessoal, mas não caia em hypes frívolos, sobretudo se você for profissional de negócios ou comunicação. Encare essa evolução com otimismo e serenidade: até pra evitar os gurus de powerpoint vendendo o hype do momento (já já eles estarão circulando por aí com o VisionPro, reiniciando aquele ciclo de empreendedorismo de palco que conhecemos desde o Second Life).
Lógico que o VisionPro ainda vai evoluir muito, bem como as tecnologias vestíveis. Entretanto, é bom frisar, enquanto estivermos sob as teias da internet, tais aplicações vão comungar do mesmo paradigma digital e móvel, a serviço das necessidades demasiadamente humanas.
Foi assim com o telégrafo do século XIX para o XX: a rede baseada na eletricidade se desdobrou em inúmeras aplicações como telefone, rádio, TV e gerou a sociedade do espetáculo. Agora, do século XX para o XXI, o que estamos vendo são os desdobramentos das aplicações da internet (o “novo telégrafo”) a partir de um paradigma comum. Paradigma que, até a próxima ordem, tem como benchmark supremo o nosso indispensável, universal e ubíquo telefone celular.