Você já ouviu falar sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) estabelecidos pelas Organizações das Nações Unidas (ONU)? Trata-se de 17 objetivos que representam “um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade” (ONU, 2021). A boa notícia é que a missão é fomentar um mundo melhor, mas a realidade é que estamos distantes da meta. Esta missão se desenvolve sobre objetivos a serem alcançados até o ano de 2030. Agora, a pergunta fundamental: temos o engajamento e a participação das diversas esferas da sociedade – pública, privada e civil?
Vamos começar com a privada? Empresas! Qual o papel das empresas privadas em promover os ODSs? Qual é a responsabilidade dessas organizações perante a sociedade? Acredito e diria que é mais importante gerar um impacto positivo do que gerar recompensa financeira ou valor para stakeholders, além de acionistas.
Para alguns, o foco e responsabilidade das empresas é apenas aumentar lucros. Anos atrás não se falava sobre responsabilidade social e em 1970, o economista Milton Friedman publicou um artigo no New York Times afirmando que “a responsabilidade social das empresas é aumentar os seus lucros”. A “doutrina de Friedman”, influenciou por décadas o modus operandi de executivos, colaboradores e empresários, buscando a aumento exacerbado dos lucros a qualquer custo.
Os nossos consumidores, entretanto, nas últimas décadas vem se transformando e esta doutrina tem sido reexaminada e reavaliada. A geração que assina o cheque hoje alega que esta visão não é de maneira alguma considerada adequada. A doutrina de Fiedman vem se tornando obsoleta e hoje a ideia de que as organizações devem se preocupar também com questões socioambientais é largamente exigida e amplamente discutida nos meios acadêmicos, públicos e empresa- riais, bem como pela sociedade civil organizada.
Claro que, analisando o cenário macroeconômico atual, ficamos um tanto quanto apreensivos quando nos deparamos com situações como o caos das Lojas americanas. Vale ressaltar que dentro os inúmeros prêmios atribuídos a conquistas ESG da companhia, a empresa “Sonho grande” foi listada no Sustainability Yearbook 2022, quase líder no ranking das companhias com as melhores notas no Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da B3. A Americanas também foi considerada uma das integrantes do Um Milhão de Oportunidade (1MiO) – iniciativa liderada pelo UNICEF e que tem como meta gerar um milhão de oportunidades de acesso à educação de qualidade, inclusão digital, formação profissional e vagas de emprego para jovens em situação de vulnerabilidade.
Qual o meu ponto?
Sou a maior defensora do ESG, aliás vivo e respiro esse fenômeno. Mas ESG no final das contas não representa também ter empatia com os fornecedores que terão suas vidas destrocadas após este escândalo? Três dos homens mais ricos do Brasil, deixaram de aportar dinheiro na empresa, e permitiram que a cadeia mais fraca caísse aos pedaços.
Os ativos de crédito da Americanas passaram de uma classificação de alta qualidade, para crédito podre da noite para o dia, gerando um efeito cascata na cadeia de fornecedores que era financiada pela companhia. Vale lembrar que aos fornecedores contentes com as estrondosas vendas de Natal, muito provavelmente não receberão a remuneração devida dos lindos presentes de natal, que aqueceram ceias de natal e encontros em família. Com uma operação baseada em lojas alugadas, que de maneira objetiva compra e vende o seu estoque, a Americanas praticamente não tem ativos. A empresa é composta por uma marca, uma cadeia de lojas, o seu processo logístico. Só em debêntures, são quase R$ 5 bilhões em circulação no mercado, além de bônus emitidos no exterior de R$ 6,7 bilhões. Estamos falando de dívidas bancárias, pequenos e médios fornecedores e demais credores, compondo um valor de quase R$ 40 bilhões.
Fiquei refletindo sobre o quanto precisamos ser conscientes e no pêndulo da sabedoria e justiça, se movimentar de maneira correta. Precisamos sim nos adequar ao ESG, mas não pode se tornar uma alavanca de crédito mais barato, prêmios, capas de jornais, revistas ou sites. Precisa ser algo verdadeiro. De nada adiantar ganhar prêmios e deixar de pagar fornecedores que provavelmente perderão uma vida de economias e suor acumulados para chegar onde estavam e logo perder tudo em um piscar de olhos. Os fornecedores médios na cadeia da Americanas que tinham alta dependência das Americanas terão inúmeros problemas mas um fundamental. Só receberão o valor devido das vendas realizadas quando ocorrer a recuperação judicial. Sabe se lá, quando receberão este dinheiro, e até lá, como farão para segurar as contas? Ninguém sabe responder.
Cabe a nós empresários e empreendedores nos preocuparmos em oferecer e desenvolver políticas reais de ESG, que sejam condizentes com a realidade 360 de cada empresa.