O bloqueio do WhatsApp por decisão judicial, ocorrido no País no mês passado, é uma medida ineficaz de combate a crimes, além de ser uma afronta ao direito coletivo fundamental da população, que é o direito à informação. Esse entendimento é unânime entre especialistas ouvidos nesta quarta-feira, 1º, em audiência pública na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos deputados, sobre o assunto.
Para o integrante do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), Thiago Tavares, a decisão, que decorreu do curso de uma investigação criminal pela Polícia Federal que pedia acesso às comunicações entre suspeitos, não se justifica, mesmo que a solicitação tenha sido negada pelo aplicativo. Ele disse que a criptografia usada pela empresa decorre de uma demanda dos usuários por mais privacidade e que essa tecnologia impõe dificuldades técnicas para a quebra do sigilo.
A pesquisadora do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas Bruna Castanheira foi mais longe. Ela afirma que o atendimento ao pedido da PF por parte do WhatsApp implicaria na quebra da criptografia do aplicativo, o que poderia criar uma porta (backdoor) que permitiria insegurança do sistema como um todo. “As investigações precisam encontrar outros caminhos que não transgridam direitos incluídos na constituição”, disse. Bruna lembra que a lei de intercepção telefônica, por exemplo, admite esse recurso como última alternativa.
“O bloqueio pode levar o criminoso a migrar para outro aplicativo, como o Telegram, que também usa criptografia e não tem representante no Brasil”, argumentou a pesquisadora. De acordo com Tavares, a migração para o app russo foi observado durante o bloqueio do WhatsApp, que chegou a perder de 7 a 10 milhões de usuários no Brasil.
A coordenadora da Proteste, Maria Inês Dolci, também repudia decisões desse tipo e sugere a criação de uma comissão especial, com a participação ativa do CGI.br, para analisar casos semelhantes. A ideia é ter decisões colegiadas, que respeitem os preceitos do Marco Civil da Internet.
O consultor legislativo da Câmara dos Deputados Daniel Petersen, especialista em Direito, considerou que pode ter havido exagero na decisão sobre o bloqueio do WhatsApp, porém, vê como ilegal a alegação do Facebook de que não pode responder porque não tem ingerência na empresa da qual é dono. Ele também tem dúvidas sobre se não é possível espelhar as mensagens, mesmo com a criptografia. “Isso ainda não ficou claro”, afirma.
O representante do CGI.br apontou saídas para dar prosseguimento às investigações sem tanta dependência da quebra do sigilo telemático. Segundo Tavares, o juiz pode autorizar que um policial se infiltre em um grupo de WhatsApp investigado ou simplesmente mandar apreender um celular, como aconteceu na Lava Jato. Ainda há a possibilidade de usar Keylogger, software usado em espionagens e cuja venda não é regulamentada. “Se a pessoa tem R$ 50 mil no bolso pode comprar o sistema de uma empresa israelense que garante o acesso das comunicações no WhatsApp antes de serem criptografadas”, disse.