Para Inma Martinez, presidente da plenária do grupo de especialistas multiatores e copresidente do Comitê Diretivo do GPAI, já que o passado da Internet não foi regulado, é importante que o presente e o seu futuro sejam. Para começar, Martinez propõe que se imponham limites e parâmetros sobre aquilo que as empresas coletam de dados. Em resumo, é preciso restringir o que uma companhia coleta de dados de uma pessoa. “Uma empresa de streaming não precisa do seu endereço residencial. Ela nunca vai te entregar nada”, exemplificou durante o segundo dia do Fórum Global sobre Ética em IA 2024, promovido pela Unesco e sediado na Eslovênia, nesta terça-feira, 6.
A representante do GPAI acredita que é preciso saber se aquele dado coletado é um exagero ou necessário para o uso daquele produto ou serviço É preciso que se justifique a extração de dados. “Precisamos também nos certificar de que as empresas que coletam dados preciosos são capazes de assegurar a segurança desses dados”, continua. Martinez sugere que os governos deveriam começar a limitar o tipo de dado coletado por empresas. “O perigo não é somente porque esses dados são abusivos e servem para construir enormes perfis de indivíduos, mas cada vez mais a comunidade de hackers está mais esperte em acessar os lugares onde esses dados estão armazenados e extrair esses dados, vender e usar para criar fake Ids, contas bancárias, roubos”, adverte.
Datacenters in loco para a que o dado fique no país
A brasileira Renata Mielli, coordenadora do CGI.br, por exemplo, sugeriu que os países instalassem seus próprios datacenters de modo que os dados ficassem estocados no país. A especialista enfatiza que o dado é economia e, uma vez concentrado nas mãos de poucas grandes companhias, somente elas tendem a crescer cada vez mais.

Renata Mielli, coordenadora do CGI.br, durante sua participação no Fórum Global promovido pela Unesco. Imagem: reprodução de vídeo
“Se eu pudesse apontar uma estratégia para os países seria: invista em datacenters para que o país tenha soberania sobre o processamento, armazenamento e o uso do dado. Com isso, será possível desenvolver sistemas que representem aspectos sociais, econômicos e culturais interoperáveis em termos de padrões tecnológicos, com mecanismos de anonimização e proteção de privacidade, assim como segurança”, explicou.
Para Mielli, o processo precisa começar com a construção de data centers para o armazenamento de dados que tenham interesse público, como saúde, educação e pesquisa.
“Atualmente, parte dos dados e do conhecimento produzido por universidades e institutos de pesquisa, por exemplo, são armazenados em nuvens privadas. Isso pode colocar em risco a soberania desses países. Há vários outros aspectos e desafios que devem ser endereçados, mas enfatizo que a soberania dos dados é central para o desenvolvimento, implementação e uso da IA”, concluiu.
IA para o desenvolvimento sustentável

Zeng Yi, professor da Academia Chinesa de Ciências e membro do Órgão Consultivo de Alto Nível sobre IA do UNSG. Imagem: reprodução de vídeo
Zeng Yi, professor da Academia Chinesa de Ciências e membro do Órgão Consultivo de Alto Nível sobre IA do UNSG, recuperou um dado de que apenas 1,1% dos artigos escritos sobre inteligência artificial estão relacionados ao desenvolvimento sustentável. Segundo o acadêmico, os temas mais explorados pelas pesquisas são saúde e educação, mas não somente porque são temas caros, importantes, mas também “porque é possível ganhar muito dinheiro com esses assuntos”, explicou em sua fala. “Mas e temas como a IA para a desigualdade, para a fome zero ou para a vida sob a água?”, questionou. “Não se ganha muito dinheiro com esses tópicos, mas os governos e a sociedade como um todo precisam desses estudos”, sugeriu.
Para Yi, é preciso aprofundar nos assuntos “reais” do mundo para fazer com que a IA seja poderosa em todos os pilares do desenvolvimento sustentável. Disse também que os países (governos) deveriam ter suas próprias IAs generativas, usando sua própria cultura e seus próprios dados para treiná-la.
IA no Comércio

Emmanuelle Ganne, analista sênior da Organização Mundial do Comércio. Imagem: reprodução de vídeo
Já sob uma perspectiva mais otimista, Emmanuelle Ganne, analista sênior da Organização Mundial do Comércio, apontou a importância da IA para a economia mundial e para os negócios transfronteiriços.
“A IA abre uma série de oportunidades para o comércio de produtos, otimização da logística e facilitação no desembaraço aduaneiro. E, de fato, muitas autoridades alfandegárias já estão usando a inteligência artificial para deixar a cadeia de suprimentos mais eficiente”, explicou.
Foto principal: painelistas do segundo dia do Fórum Global sobre Ética em IA 2024