Na última quarta-feira, 6, o WhatsApp (Android, iOS) atualizou seus termos e política de privacidade. Entre os pontos polêmicos, está o compartilhamento de dados de transações financeiras e o envio de material de marketing sobre empresas do grupo Facebook. Os usuários devem aceitar o novo texto até 8 de fevereiro. Caso contrário, o app de mensageria poderá excluir a conta de quem não concordar.
De acordo com a nova política, o compartilhamento aprimora os sistemas de infraestrutura e entrega; promove segurança e proteção para os produtos das empresas do Facebook; e deve combater mensagens indesejadas, como spams. A nova política, porém, não explica como isso será feito.
Outro ponto assinalado pela empresa trata do compartilhamento de transações, que permite a conexão da conta do usuário para usar o Facebook Pay: “Fornecer integrações que possibilitem a conexão de suas experiências do WhatsApp com outros Produtos das Empresas do Facebook. Por exemplo, permitir que você conecte sua conta do Facebook Pay para realizar pagamentos no WhatsApp ou habilitar a conversa com seus amigos em outros Produtos das Empresas do Facebook, como o Portal, conectando sua conta do WhatsApp.”
A respeito dos dados coletados de transações e pagamentos, a política diz que, caso o usuário utilize serviços de pagamento dentro do WhatsApp, serviços de compra ou outras transações financeiras, o app de mensageria trata esses dados adicionais, como a conta para pagamento e os dados da transação. “Os dados de conta para pagamento e transação incluem informações necessárias para concluir a transação (como informações sobre sua forma de pagamento, dados de envio e valor da transação)”, justifica o texto.
A política atualizada diz ainda que o WhatsApp pode enviar material de marketing sobre as empresas do Facebook. Além disso, a empresa usará seus dados coletados do aplicativo e de outros serviços do Facebook para sugestões de conteúdo, recomendações de pessoas e anúncios, juntamente com melhorias no serviço.
Outras justificativas para o compartilhamento de dados com outras empresas do Facebook são, segundo a empresa, o aprimoramento dos serviços ofertados e a experiência ao usá-los. Entre os exemplos, o texto do termo cita as sugestões feitas pelo app, como de conexões de grupos ou amigos, ou de conteúdo que possa ser interessante, além de personalização de recursos e conteúdos, ajuda para realizar compras ou transações e exibição de ofertas e anúncios relevantes sobre os produtos das empresas do Facebook.
“Essa nova política é questionável em especial porque ela não oferece escolha. Ou você aceita e continua usando ou não aceita e não poderá usar o WhatsApp, mas é um app que faz parte da vida das pessoas, dos negócios. O usuário fica refém porque você precisa do aplicativo”, afirmou em conversa com Mobile Time Daniel Sales Godinho Alves, advogado do escritório Cerqueira Leite e DPO.
Vale lembrar que, de acordo com a pesquisa Panorama Mobile Time/Opinion Box sobre uso de apps no Brasil, o app de mensageria é a aplicação mais aberta pelos usuários de smartphone ao longo do dia, apontado por 54% dos brasileiros, seguido pelo Instagram (14%) e Facebook (11%). Esta é exatamente a mesma ordem no ranking de presença na tela inicial. O WhatsApp está presente na home screen de 56% dos smartphones; Instagram, em 45%; e o Facebook, em 43%. Além disso, de acordo com outra pesquisa, Panorama Mobile Time/Opinion Box sobre mensageria móvel, o WhatsApp está instalado em 99% dos smartphones brasileiros.
A nova política de privacidade a partir da LGPD
Segundo o advogado, o WhatsApp é um provedor de aplicação que presta um serviço que, apesar de gratuito, fere a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o próprio código de defesa do consumidor. Apesar de não ter dinheiro envolvido, o “preço” são os dados pessoais dos usuários. “Neste caso, somos consumidores e, na LGPD há o princípio da necessidade, ou seja, a empresa precisa dos dados para executar o serviço e, por isso, ela os captura. Neste caso específico, será realmente necessário compartilhar os dados com o Facebook?”, questiona. “Acho que não”, respondeu o próprio.
Flávia Lefèvre, advogada especializada em direito digital e do consumidor, também aponta que o compartilhamento de dados sobre transações aumenta ainda mais o poder de mercado que o Facebook exerce, “pois a ampliação de tratamento dos dados financeiros amplia também o poder do Facebook e do WhatsApp para servirem de plataforma para intermediar cada vez mais operações comerciais”. E complementa: “Ainda que tenhamos a LGPD, esta se restringe a definir limites para o compartilhamento e a necessidade de que o titular dos dados consinta com a prática. A LGPD não impede os efeitos da concentração de dados cada vez maior dessas empresas que atuam como monopólios globais. Tanto a CE (Comunidade Europeia) quanto os EUA estão tentando confrontar o poder de mercado das big techs, mas, infelizmente, nós aqui estamos longe de ter instituições competentes que ponham limites na atuação dessas empresas – no caso o CADE e a Secretaria de Defesa do Consumidor do MJ”.