O PL 2338/2023, que regula a inteligência artificial no Brasil, precisa ser revisitado. É o que acredita a professora do programa de tecnologias da inteligência e design digital na PUC-SP, Dora Kaufman. Ela acredita que os 45 artigos do projeto de lei assinado pelo presidente do senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e de relatoria do senador Eduardo Gomes (PL-TO), não estão prontos para serem aplicados pela população brasileira.
Um dos principais motivos para o PL ser revisado é o fato que o texto foi preparado antes do crescimento das soluções baseadas em grandes modelos de linguagem (LLMs) como o ChatGPT, da OpenAI, disse Kaufman durante o GenAI Summit, evento organizado pela Deloitte nesta quarta-feira, 7. Ou seja, o atual texto não prevê a IA generativa.
Outro motivo que a especialista indica é que falta um debate mais amplo com grupos especializados. Embora veja como positivo o apoio do grupo de 18 juristas, Kaufman afirma que precisaria da participação da sociedade civil e da academia, mas principalmente as equipes dos órgãos reguladores (Anatel, Anvisa, ANP, ANPD, Aneel, Banco Central, por exemplo) para colaborarem com o texto.
Na visão da professora e pesquisadora, o grupo de especialistas precisaria de um período mínimo de nove meses para debater e colaborar com o PL 2338/2023, um prazo bem mais amplo, levando em conta que o comitê especial de IA do Senado termina em maio deste ano.
Kaufman também viu com estranheza o substitutivo apresentado pelo senador Marcos Pontes (PL-SP), uma medida unilateral que tenta simplificar o projeto. Contudo, a pesquisadora afirma que o problema não é deixar simples o projeto de lei, mas trazer um amplo debate. Porém, a especialista reconhece que tem pouca chance com o cenário no horizonte mais curto para as votações no Congresso Nacional, ante as eleições municipais do segundo semestre de 2024.
Setorial
Segundo a professora, o cenário mais crível de regulação é uma administração setorial. Ou seja, o regulador analisa e aplica as regras em seu setor, como Banco Central nas finanças, Anatel em telecomunicação e Anvisa em saúde.
Também acredita que os reguladores podem fazer um trabalho de levantar e sintetizar um compêndio de leis que já existem na legislação brasileira e que podem ser aplicadas na regulação da IA em cada setor, como Marco Civil da Internet e LGPD.
TSE
Kaufman lembrou também que o TSE vem trabalhando com IA generativa e criando normas atualizadas e que o ministro Luis Barroso convocou especialistas e juristas para colaborarem com as regras. Inclusive, uma das normas determina que as agências de publicidade e propaganda dos partidos políticos devem informar quando veicularem uma peça com IA generativa.
Para Kaufman, o uso da IA generativa por partidos políticos deveria ser proibido e informado para a população, pois a tecnologia foi usada como deep fake em eleições majoritárias recentemente na Eslovênia e na Argentina para atingir candidatos que participavam do pleito. E acredita que mesmo se a peça tiver uma marcação que foi usada IA generativa, o eleitor comum não vai discernir de uma peça sem a tecnologia.
Vale lembrar, o TSE pode aplicar mudanças tecnológicas devido ao artigo 57-J da Lei das Eleições (9.504/2007) , vide:
O Tribunal Superior Eleitoral regulamentará o disposto nos arts. 57-A a 57-I desta Lei de acordo com o cenário e as ferramentas tecnológicas existentes em cada momento eleitoral e promoverá, para os veículos, partidos e demais entidades interessadas, a formulação e a ampla divulgação de regras de boas práticas relativas a campanhas eleitorais na internet.
Imagem principal: Larissa Galimbert, sócia da banca Pinheiro Neto (esq.); Alex Borges, sócio na Deloitte (centro); Dora Kaufman, professora e pesquisadora da PUC-SP (crédito: Henrique Medeiros/Mobile Time)