Algumas empresas estão vendo no serviço de delivery a tábua de salvação para os seus empreendimentos. Mobile Time entrevistou representantes de algumas startups que transformaram seu modelo de negócios com entregas e não se arrependeram. É o caso de Eats for You, Picap e Tagme.
Na Eats for You (Android, iOS), startup que faz a ponte entre cozinheiros e quem deseja comer uma comida caseira, o cliente fazia o pedido da comida que desejar no marketplace e selecionava um dos pontos de retirada da marmita. Esses estavam estrategicamente localizados em áreas com grande concentração de escritórios empresariais em São Paulo. A Eats for You pegava as marmitas nas casas dos “tios” e “tias”, como são chamados os donos e donas de casa que cozinham na plataforma, e enviava para esses pontos de retirada para que os clientes pegassem o que haviam comprado pelo aplicativo. Contudo, com o início do isolamento social, a Eats for You se viu sem clientes de uma hora para outra. Para sobreviver, desenvolveu em dias um sistema de delivery.
“O impacto foi muito grande. Tivemos que fazer um extreme makeover”, conta Nelson Andreatta, idealizador da Eats for You e publicitário. “43% das empresas ficaram em home office e muitos centros empresarias fecharam. Nosso negócio foi de 100 a zero e, para continuar gerando renda às donas e aos donos de casa, lançamos o delivery no dia 23 de março e tivemos uma semana para nos organizar“.
Para montar a estrutura de delivery ponto a ponto, o time de logística – que fazia o recolhimento das marmitas e deixava nos pontos de entrega – cresceu 78% na comparação do dia 31 de março com o dia 20 do mesmo mês. Quando a crise passar, Andreatta acredita que a Eats for You vai voltar aos pontos de distribuição, mas não abandonará o delivery.
Outra que mudou consideravelmente foi a Tagme, empresa B2B que oferece há 10 anos soluções tecnológicas para a área de gastronomia, com ferramentas digitais de hospitalidade para restaurantes, como serviços online de reservas, gestão de filas, menus em tablets ou no próprio celular do cliente, captação de usuários, fidelização e CRM. Sua proposta sempre foi levar pessoas até os estabelecimentos. Porém, com a crise ameaçando os restaurantes, o sócio-diretor da Tagme, João Paulo Alves, e sua equipe desenvolveram em dias a solução de delivery para seus clientes, algo que não estava no roadmap da empresa no curto prazo, mas estava sendo estudado para ser lançado em 2021.
“Sempre nos perguntávamos se deveríamos ou não entrar no delivery. De qualquer forma, tínhamos a proposta de que o restaurante não dependesse de um marketplace. É importante, mas não é essencial. Quando chegou a pandemia, pegamos 70% dos desenvolvedores da empresa e os colocamos com o foco de, em curtíssimo prazo, desenvolver a plataforma de delivery. Lançamos e fizemos um esforço de contatar nossos clientes para oferecer o novo serviço. Em 10 dias temos 120 restaurantes cadastrados na plataforma”, explica Alves. Vale dizer que a Tagme tem operações em 50 cidades e, antes da crise, havia quase 1 mil restaurantes em sua base.
O delivery desenhado pela Tagme é voltado para clientes frequentadores de seus restaurantes preferidos. A empresa está integrada às redes sociais, ao Google, Google Maps, bancos, cartões de crédito e outros geradores de demanda. “O cliente entra no Instagram do restaurante e clica no botão para pedir comida”, resume o sócio-diretor que, para a entrega, fez uma parceria com a Loggi (Android, iOS).
Por enquanto, o modelo de negócios do delivery da Tagme consiste em oferecer por 90 dias aos estabelecimentos a uma taxa de 5,5%, que paga o gateway e a operação como um todo. O custo da Loggi é à parte e pode ser cobrado diretamente para quem está comprando do restaurante.
Outra que se adaptou foi a colombiana Picap (Android, iOS), empresa de transporte de passageiros com motociclistas. Com a pandemia do novo coronavírus, a ideia de entrar no segmento de entregas de produtos – projetada para sair do papel apenas no fim do segundo semestre deste ano – precisou ser acelerada e, em uma semana, a startup lançou sua nova solução.
O novo serviço consiste em pegar um produto ou um documento e entregar no lugar combinado. Toda a negociação é feita pelo aplicativo e a Picap não está cobrando nada no momento. O valor do serviço é combinado entre motociclista e usuário da plataforma sem a interferência ou a cobrança da startup.
O foco da Picap está no pequeno comércio por ser “quem mais sofre”, explica o CEO da empresa no Brasil, Diogo Travasso. “A gente entendeu que é nossa responsabilidade sair com isso e os motociclistas que estão na nossa base usam o app como ganha-pão. O ecossistema mudou, não sabemos para onde vai, mas para a gente faz sentido ajudar também o pequeno comerciante. Se a solução for boa e resiliente, será cobrado quando o cenário estiver mais apaziguado”.
O desafio atual é alcançar o pequeno comerciante, por ele não fazer parte da base da empresa. É preciso começar do zero o contato para propor o serviço. E, da parte do entregador, a Picap aceita, no momento, pessoas com bicicletas ou mesmo a pé para fazer o trabalho.
“Não estamos nos restringindo no momento. A ideia é pegar um documento numa repartição pública, por exemplo, comprar na pet shop da esquina para o morador que não pode sair de casa. É para ser abrangente mesmo, para ser um teste”, explica.
Seu serviço de transporte de passageiros continua, principalmente para atender quem precisa se deslocar rapidamente pela cidade, como profissionais de saúde, mas seu peso diminuiu no app “Até quatro semanas atrás, o serviço de entrega, que estava começando, representava 2% do que fazíamos. 98% era transporte de passageiro. Hoje, a entrega já está na casa dos 30%. O transporte de passageiros não acabou, ainda tem gente que precisa e é importante que continue. Mas nosso foco atual é ajudar que tenha menos gente na rua”.
Travasso explica para Mobile Time que apesar das operações terem começado recentemente, em 2019, a Picap estava indo muito bem, com uma base de 20 mil parceiros motociclistas. Por isso, os planos para 2020 eram grandes. “A nossa expectativa mudou um pouco. Olhamos para 2020 como um ano que terá um vale [declínio] e uma retomada no segundo semestre. É um período difícil e estamos nos adaptando para isso, mas acreditamos em uma retomada até o final do ano, algo como 80% a 90% do que a gente fazia”.