O primeiro dia de julgamento do TikTok (AndroidiOS) na Suprema Corte dos Estados Unidos nesta terça-feira, 10, teve o advogado da plataforma defendendo o app a partir da ótica do discurso livre e da Primeira Emenda dos EUA. Já do outro lado, a representante do Departamento de Justiça afirmou que a lei aprovada que obriga o desinvestimento da ByteDance no app, defende a segurança nacional do país.

Noel Francisco, o representante da defesa da rede social, afirmou que a questão principal é se o bloqueio contra um app estrangeiro fere a primeira emenda dos EUA: “Esse caso é sobre discursos e ideias. Ideias que podem manipular e persuadir, isso tudo está na primeira emenda. O governo não pode censurar o direito do americano”, afirmou.

Vale lembrar, a Primeira Emenda abre a Constituição dos EUA e traz as liberdades fundamentais dos norte-americanos, ao defender a liberdade de imprensa, liberdade religiosa, de associação pacífica, de fazer petições ao governo para corrigir erros e a liberdade de discurso, ao dizer:

O Congresso não aprovará nenhuma lei que estabeleça uma religião ou proíba o seu livre exercício; ou que restrinja a liberdade de expressão ou de imprensa; ou o direito do povo de se reunir pacificamente e de fazer petições ao Governo para reparação de queixas.

Governo no ataque contra o TikTok

Por sua vez, Elizabeth Pregolar, procuradora dos EUA e defensora do projeto de lei Protecting Americans from Foreign Adversary Controlled Applications Act, afirmou que os aplicativos que são controlados por adversários estrangeiros trazem grave risco à segurança nacional, com coleta de dados e propaganda.

Pregolar disse ainda que a continuidade do TikTok sob controle da ByteDance traz o risco que “um adversário pode armar (weaponizing, no original em inglês) a plataforma para afetar os EUA”. A representante do governo afirmou ainda que a rede social expõe o país para o risco de chantagem e espionagem, ao influenciar adolescentes que usam o TikTok hoje e podem se tornar militares ou funcionários seniores do governo (leia-se agentes do FBI, CIA, NSA ou Departamento de Estado) no futuro.

Francisco lembrou que o Congresso norte-americano, embora tenha passado a lei com amplo apoio dos dois partidos da Casa (republicanos e democratas), em abril do ano passado, não demonstrou uma prova sequer que o TikTok ou a ByteDance podem influenciar com os seus conteúdos para os consumidores do país. E que a lei sancionada pelo presidente Joe Biden cala o discurso ao tirar o acesso de 170 milhões de norte-americanos à plataforma.

A voz dos criadores de conteúdo

Jeffrey L. Fisher, representante dos produtores de conteúdo do TikTok, também participou dos argumentos de abertura do julgamento. Em sua posição, o advogado afirmou que, se o Tribunal mantiver a lei aprovada pelo Congresso dos EUA, a decisão abrirá precedente para os norte-americanos não terem liberdade na criação de conteúdos com empresas estrangeiras, como documentários, séries e filmes com a BBC.

Fisher também defendeu que a primeira emenda permite que os norte-americanos recebam informações de terceiros, inclusive estrangeiros. E que o único modo de se comprovar risco à segurança nacional, seria se o Congresso tivesse observado a substância dos argumentos e comprovado influência chinesa, o que não foi provado.

Se a Suprema Corte mantiver a decisão do Congresso e sanção de Biden no julgamento TikTok versus Garland (nome oficial, em alusão ao procurador-geral Merrick Garland), a ByteDance tem até o dia 19 de janeiro para desinvestir no app, passar o controle para uma empresa norte-americana ou de nação amistosa aos EUA ou o app será desconectado nas redes e das lojas de apps no país. Esse ponto foi frisado no começo do julgamento pelos criadores da lei, os congressistas Mike Gallagher e Raja Krishnamoorthi.

Vale lembrar, o Project Liberty liderado pelos bilionários Frank McCourt e Kevin O’Leary fez uma proposta na última quinta-feira, 9. A ideia do grupo é adquirir a operação norte-americana dos EUA, uma vez que esperam que a decisão do governo seja mantida pelo Tribunal. Os valores não foram informados.

Questões dos juízes

Durante a exposição de abertura, os juízes da Suprema Corte questionaram os advogados e a procuradora. O juiz Neil Gorsuch perguntou à procuradora Pregolar se a decisão abre precedente para bloquear outras plataformas estrangeiras que atuam nos EUA e dependem da primeira emenda, como o Politico, um dos principais sites de notícias políticas dos EUA, que é controlado por uma empresa alemã. A representante do Departamento de Justiça disse que os jornais não coletam dados dos americanos e os enviam para adversários estrangeiros.

Em resposta a outro posicionamento de Pregolar, que o TikTok está fazendo os americanos discutirem, o presidente da Corte, John Roberts, disse que se o TikTok está fazendo os cidadãos discutirem entre si, então “eles estão ganhando”. A procuradora contra-argumentou dizendo que a China (aqui dita várias vezes como ‘PRC’, a sigla em inglês para República Popular da China) tem apetite em captar o máximo de informação dos americanos e que isso cria uma potente arma para os chineses.

A juíza Sonia Sotomayor questionou o advogado dos criadores de conteúdo sobre quantas plataformas possuem um mecanismo de coleta de dados similar ao TikTok. Fisher respondeu que muitos sites têm a habilidade de coleta de dados, inclusive comércios eletrônicos, e mesmo assim, os norte-americanos aceitam compartilhar os dados.

Mais tarde, ao abordar a procuradora dos EUA que atacava o fato de o TikTok estar ligado à ByteDance e ao governo chinês, a juíza Elena Kagan, lembrou que todas as redes sociais têm coleta de dados e mantêm seus algoritmos de forma escondida: “Qualquer dos algoritmos de redes, o X, a rede nova, BlueSky, nenhum deles deixa claro como você recebe o conteúdo. É tudo uma caixa escura. Dizer que a China está por trás, todo mundo sabe!”, pontuou a juíza.

Outro argumento que trouxe muitos questionamentos dos juízes foi uma fala de Pregolar sobre TikTok ter “conteúdos escondidos” para influenciar os norte-americanos. O juiz Clarence Thomas e a juíza Kagan questionaram que tipo de conteúdo estaria oculto e o magistrado ainda perguntou se existe diferença entre conteúdo manipulado por empresa dos EUA ou estrangeira. Pregolar disse que a primeira emenda não pode ser usada por um adversário estrangeiro para explorar o controle de uma plataforma de mídias sociais e adicionou que a decisão do Congresso dos EUA focou em atacar esses conteúdos escondidos.

Antes da fala de Pregolar, Noel Francisco, advogado do TikTok, supôs que se o Jeff Bezos (acionista majoritário da Amazon) fosse forçado a escrever um editorial favorável ao governo chinês em seu jornal Washington Post, algo que fosse fruto de chantagem ou vantagem comercial, a primeira emenda o protegeria e o governo não poderia derrubar o artigo.

Diversas vezes Gorsuch e outros juízes questionaram se seria possível outra solução que não fosse um bloqueio, como um alerta no acesso, Pregolar disse que isto seria generalista e não funcionaria. Já o juiz Samuel Alito questionou se seria o caso de adiar o pedido, levando em conta a mudança de governo, mas a procuradora disse que não e prefere seguir com o julgamento, uma vez que, em sua visão, o TikTok foi alertado dessa mudança em 2024 e, se comparar com a compra do X feita do por Elon Musk, a plataforma poderia ser vendida em seis meses.

Imagem principal: Ilustração produzida por Mobile Time com IA

 

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