A Coalizão Direitos na Rede, que congrega organizações representando a sociedade civil, emitiu nota de repúdio aos nove vetos do presidente Jair Bolsonaro na sanção do Projeto de Lei de Conversão 7/2019, que altera a lei 13.709/2018 e cria a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). Para a entidade, ao retirar os itens, o presidente “desrespeita acordos firmados no processo legislativo” nos últimos dois anos e que resultaram no texto final da medida provisória 869/2018, aprovada em maio deste ano. Os vetos no PLV 7/2019 foram sobre decisão automatizada; as sanções, aplicadas aos agentes de tratamento de dados, no caso das infrações cometidas; o perfil do encarregado; taxas como fonte de recursos para a ANPD e o compartilhamento dos dados pessoais de requerentes de acesso à informação com empresas privadas.
Em nota divulgada no Twitter nesta quarta-feira, 10, a Coalizão diz que vai trabalhar para derrubar os vetos e “garantir que a legislação mantenha sua identidade”, impedindo que a lei atenda a interesses de empresas e seja usada de forma indevida. A ideia é trabalhar junto a parlamentares no Congresso para sensibilizá-los a respeito do tema.
A entidade acredita que o pacto entre diferentes setores na discussão e aprovação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) “foi rompido por influência de setores empresariais, que atuaram para prevalecer seus interesses de mercado”. Além disso, afirma que os vetos aprofundam o quadro de fragilidade da ANPD, que já teria sofrido abalos por não contar com mecanismos de independência financeira e institucional ou um corpo técnico altamente profissionalizado. “Além de remar na contramão do debate global sobre proteção de dados, o governo Bolsonaro fortalece segmentos privados em detrimento da segurança dos cidadãos brasileiros.”
“Claro que a Lei de Conversão aprovada não era perfeita, mas havia ali uma síntese das discussões que envolveram diversos setores. Era fruto de negociação. Os vetos demonstram a disposição do Executivo de apenas reagir à pressão de algumas poucas empresas e seus lobistas de plantão, e ignorar a proteção aos cidadãos e consumidores brasileiros”, justifica a relações institucionais do coletivo Intervozes (parte da Coalizão Direitos na Rede), Marina Pita.
Entre os pontos levantados, o coletivo critica o veto relacionado à decisão automatizada, afirmando que isso impede a medida de transparência prevista no texto original. O item possibilitava que uma pessoa natural pudesse solicitar a revisão de decisões automatizadas que afetam interesses particulares – ou seja, ações tomadas por algoritmos na construção de perfil pessoal, profissional, de consumo ou mesmo de personalidade. “A medida visava oferecer mais transparência e accountability para decisões algorítmicas e garantir aos titulares dos dados a possibilidade de correção de eventuais discriminações originárias do tratamento de seus dados”, explica a entidade.
Segundo a presidenta do Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife (IP.rec, organização que também integra a Coalizão), Raquel Saraiva, os vetos são “um retrocesso” no que foi negociado no Congresso. “No fim das contas prevaleceu o interesse econômico em detrimento da defesa dos direitos dos cidadãos. As discussões e os posicionamentos em audiência pública foram completamente ignorados pelo governo. E a LGPD perdeu uma grande parte da garantia de direitos que tinha originalmente”, disse, em nota.