Após um apoio inicial, a Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional) se manifestou contra “alguns artigos” do texto final do Projeto de Lei de Proteção de Dados Pessoais aprovado na Câmara e no Senado (PLC 53/2018) e que tem prazo final para sanção do presidente Michel Temer no dia 14, terça-feira da próxima semana. A entidade divulgou nota nesta sexta-feira, 10, propondo vetos em três itens específicos: capítulos VIII (“da Fiscalização”); IX (“Da Autoridade Nacional e do Conselho Nacional”) e na Seção III e Capítulo VI (“Da Responsabilidade e do Ressarcimento de Danos”, artigos 42 a 45 do projeto).

“Nós defendemos a sanção da lei com vetos para que possamos contar com uma base legal e um correspondente às leis de outros países, destravando processos de investimento e mesmo troca de informação e integração de serviços”, disse o presidente da entidade em Goiás, Ricardo Silva, em entrevista exclusiva para Mobile Time.

Em comunicado, o presidente nacional da Assespro, Jeovani Salomão, afirmou que, “embora atinja substancialmente os objetivos originais”, a redação final do projeto deve passar pelos vetos sugeridos. O representante afirmou que sua entidade sempre se manifestou a favor da proteção de dados pessoais, mas ressalta que é necessário manter “equilíbrio saudável entre a proteção dos dados privados referentes às pessoas naturais e o normal funcionamento e sustentação da atividade empresarial que depende do tratamento destes dados.”

Na visão da associação, o veto ao item da criação da autoridade nacional se justifica porque entende que é necessário que a ANPD seja um órgão regulador “em vez de ter as funções de regulação, controle, inspeção e punição simultaneamente”. A Assespro frisou que o texto do PLC 53 propõe que a autoridade possa “legislar por meio da edição de regulamentos”.

Fiscalização

Por sua vez, o veto ao item de fiscalização é sustentado ao argumentar que as sanções previstas no capítulo VIII não têm clareza na redação, “permitindo interpretações extremamente radicais (especialmente no que concerne à dosagem na aplicação das multas simples e diárias, cuja redação atual poderá resultar em aplicação de penalidades com valores dispares entre a gravidade da violação ocorrida e a intensidade da sanção aplicável), combinado com a dificuldade em mensurar os diversos parâmetros e critérios apontados nos artigos 55 que lá estão dispostos de forma excessivamente subjetiva”. A associação alega que a possibilidade de a ANPD suspender a atividade econômica do infrator pode colocar em risco atividades econômicas importantes para o País.

No mesmo capítulo, a associação sugeriu mais um veto na lista de sanções administrativas: a entidade acredita que o princípio da responsabilidade civil já está consagrado no direito civil pátrio no Código Civil e na legislação, incluindo o Código de Defesa do Consumidor. Em sua oposição, a Assespro defendeu que o capítulo seja reescrito para contemplar penalidades, inclusive multas pecuniárias “suficientemente inibidoras dos danos que possam ser causados a terceiros em face do tratamento de dados”.

A associação finaliza a nota enfatizando que o Executivo acate os pedidos de vetos e que, junto com o Legislativo e a sociedade civil, sejam retomadas as discussões para o “aperfeiçoamento da lei”. Jeovani Salomão ressalta que é necessário levar em conta um modelo de autoridade reguladora, maior “participação paritária” entre os diversos representantes do governo e sociedade civil, incentivo a autorregulamentação e a reorganização de atribuições e responsabilidades de órgãos governamentais envolvidos na consecução das atividades da ANPD. Afirmou que é preciso “definir regras para os agentes econômicos cujas atividades atuais são proibidas pelas novas regras, tais como as tradicionais listas telefônicas ao alcance da população, garantidas pela Lei Geral de Telecomunicações”.

Para Silva, a lei representa um grande avanço no marco legal e respeito ao tratamento de dados pessoais no Brasil. Ela é o resultado do amadurecimento da nossa sociedade e de legisladores no sentido de entenderem a importância dos dados pessoais na nova economia e na garantia do direito e liberdade individual. “Seu maior impacto será, sem dúvida, as garantias dadas aos cidadãos e às entidades públicas e privadas que passam a contar com um dispositivo legal que define de fato os limites no tratamento destes dados”, afirma Silva.

Ainda de acordo com o presidente da Assespro de Goiás, “a lei não é perfeita, como nenhuma é. Sofrerá inevitavelmente processo de ajustes e adequações. Tem sim alguns pontos dúbios, em especial no que trata da autoridade, seu poder de fiscalização e regras para a aplicação de sanções. A discussão bastante acalorada da constitucionalidade da sua criação nos moldes que ocorreram abre espaço para questionamentos quanto à sua validade. Assim achamos mais adequado que esta matéria seja objeto de medida provisória numa proposta mais ajustada à nossa realidade. Temos que considerar modelos com maior peso da autorregulação e participação do setor produtivo e sociedade.”

Menos apoio

No início da semana, outra entidade setorial retirou o apoio à sanção integral do PLC 53: a Associação Brasileira de Empresas de Software (Abes) . No argumento da entidade, a ANPD teria “poderes excessivos”, além de ser inconstitucional por ser uma agência regulatória criada pelo Legislativo, em vez do Executivo. Uma carta com mais de 30 entidades do terceiro setor e dos setores empresarial (incluindo, na época, a Abes), acadêmico e público, incluindo o Ministério Público do Distrito Federal, foi divulgada em junho para manifestar apoio à sanção do projeto. O entendimento no governo, entretanto, parece ser o de necessidade de fatiamento da proposta, incluindo o veto à criação da autoridade nacional.

 

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