Causou bastante surpresa ao mercado, conforme relatos ouvidos por Teletime, a divulgação, pela Anatel, de uma nota evasiva sobre o uso de ferramentas de geolocalização dos usuários na rede. A nota da Anatel não assume posição sobre o tema, alertando apenas para a necessidade de estudos e embasamento jurídico. O posicionamento foi visto como combustível para aumentar a temperatura de uma discussão que já está bastante sensível no Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, desde que o presidente Jair Bolsonaro determinou ao ministro Marcos Pontes colocar na geladeira parceria que havia sido anunciada no começo do mês com as teles. Iniciativa que conta com respaldo jurídico da Consultoria Jurídica do ministério, ligada à AGU, e da área técnica do MCTIC.

Segundo apurou Teletime, a preocupação da agência em publicar a nota foi a de alertar para o fato de que a Anatel não tem uma posição sobre o tema nem autoriza previamente esse tipo de tecnologia, ainda que reconheça o potencial das aplicações, e fazer um alerta institucional, uma admoestação no sentido de que se busque mais respaldo para esse tipo de iniciativa. A Anatel também teria ficado especialmente inconformada ao ter sido citada em reportagem do site The Intercept sobre o uso de dados pela Vivo, como tendo autorizado determinadas políticas de comercialização de dados da operadora, o que a agência nega. Por não ter um entendimento geral, a Anatel prefere apenas conjecturar sobre as implicações e riscos, à luz dos instrumentos legais definidos.

Provocada sobre o caso concreto em que empresas de telecomunicações estão compartilhando, com governos estaduais, dados anonimizados e agregados de localização, uma fonte graduada da Anatel reconhece que de fato não há indicativo de riscos, mas que o ideal é que estas medidas estivessem respaldadas pela avaliação de entidades como Ministério Público, OAB, entidades da sociedade civil e academia, justamente pela ausência de uma autoridade governamental com respaldo legal para isso, como seria a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (prevista em lei mas ainda não instalada), já que existem muitas implicações jurídicas.

A Anatel não é contrária ao uso de informações coletadas da rede para o acompanhamento dos serviços, tanto que tem um projeto de criar até mesmo uma ferramenta de crowdsourcing para acompanhar o desempenho das operadoras. Mas entende que este tipo de uso das informações requer atenção redobrada.

Assunto delicado

Fato é que a questão do compartilhamento dos dados dos usuários das redes tornou-se um assunto especialmente delicado depois que os filhos do presidente Jair Bolsonaro, Eduardo e Carlos Bolsonaro, passaram a criticar o acordo feito pela gestão do governado João Dória com as operadoras. Bolsonaro pediu ao ministro Marcos Pontes, segundo relatado pelo próprio ministro, para suspender o acordo com as teles no âmbito Federal e estudar um pouco mais o assunto. O uso das informações de geolocalização no combate à Covid-19 é considerado essencial para medir o nível de confinamento das cidades. Na Europa, por exemplo, estuda-se medidas ainda mais abrangentes, que passam por aplicativos em que os próprios usuário relatam sua condição clínica e histórico médico para acompanhamento dos níveis de imunização. O Brasil está longe disso.

No ministério, há o temor de que a politização da questão possa impedir o avanço do desenvolvimento de uma plataforma nacional. Segundo um representante de uma operadora de telecomunicações, não existe nada de novo no que está sendo proposto, o mesmo tipo de compartilhamento já foi feito em grandes eventos e é muito comum o uso destas informações por autoridades de trânsito, por exemplo. “A tecnologia permite, em tese, qualquer coisa. Nesse caso, o que propusemos é o básico, que é contar quantos usuários estão ligados a cada antena, sem risco nenhum de invasão de privacidade. Mas a decisão de usar ou não essa ferramenta é política”.

 

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