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Quem entrou nas redes sociais na última semana deve ter se espantado com fotos de amigos jovens demais ou envelhecidos. Nos últimos dias, o FaceApp (Android, iOS) viralizou com seus filtros que modificam as fotos de seus usuários, mas também causou polêmica. O app usa inteligência artificial para fazer as modificações nos rostos e coleta milhões de informações biométricas de seus usuários. De acordo com a política de privacidade e termos de uso, o aplicativo acessa não apenas a galeria de imagens do smartphone e sua câmera, como também pede acesso à rede, à lista de contatos, endereço IP, tipo de navegador, nomes de domínios acessados, páginas visualizadas, entre outras informações que pouco ou nada têm a ver com o serviço prestado. Isso trouxe preocupação por parte dos consumidores em relação à segurança e à privacidade do app, que faz lembrar o escândalo da Cambridge Analytica, empresa britânica que captou e usou dados de 87 milhões de pessoas por meio de um jogo no Facebook.

Mobile Time consultou especialistas em segurança  e privacidade digital e constatou que o aplicativo pode até ser seguro, no sentido de não ser uma porta para malwares, vírus ou outros perigos. Porém, em se tratando de privacidade, está longe daquilo exigido por leis como a europeia GDPR e a brasileira LGPD,  que entrará em vigor em 2020.

Segurança

Nikolaos Chrysaidos, head de ameaças em dispositivos móveis & segurança da Avast, ressaltou que “não há permissões suspeitas na versão mais recente do aplicativo, que pode ser encontrada no Google Play”. O especialista checou o app em sua plataforma de segurança, Apklab.io, e concluiu que a comunicação do aplicativo com o servidor principal é segura e que, aparentemente, o app não está enviando dados suspeitos através da conexão.

Conclusão similar teve o diretor do dfndr lab da PSafe, Emilio Simoni. Em sua análise, o executivo não identificou nenhum tipo de brecha de segurança que possa colocar os usuários do aplicativo em perigo ou deixá-los vulneráveis a alguma ameaça digital. Em sua visão, as permissões de acesso ao celular do usuário “são necessárias para o funcionamento correto de todos os recursos do aplicativo”.

Privacidade

No entanto, Fabio Assolini, analista sênior de segurança da Kaspersky, vê problemas na privacidade do FaceApp: “A questão da privacidade é a maior preocupação envolvendo o uso de aplicativos como esse. Na análise que realizamos especificamente com este app, não encontramos nada malicioso, uma vez que a foto é enviada para seus servidores, que fazem a modificação e enviam de volta para o usuário”. No entanto, o risco estaria na venda dos dados biométricos dos usuários para empresas com soluções de reconhecimento facial, alerta Assolini. O especialista da Kaspersky lembra ainda que seu colega David Emm avisou sobre o problema de privacidade do app em entrevista ao International Business Times em 2017.

No campo do direito digital, a política de privacidade e os termos de uso do FaceApp são vagos e abrem brecha para que a Wireless Lab, empresa desenvolvedora do aplicativo, armazene dados biométricos dos usuários e compartilhe as informações coletadas com empresas parceiras e afiliadas.

Para Renato Leite Monteiro, sócio do escritório Baptista e Advogados e responsável pela área de proteção de dados, sua política de privacidade e seus termos de uso violam leis como a brasileira Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e a europeia Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR, na sigla em inglês). “É uma política de privacidade genérica, ampla demais, e não dá para entender por que a empresa coleta e-mails, características do aparelho, identificador único, e por onde o usuário circula pela Internet. Ele coleta muito mais dados do que precisa para oferecer seus serviços. Na nossa lei, por exemplo, um aplicativo só pode coletar dados para atingir a finalidade almejada que, no caso, é aplicar um filtro às fotos”, explica.

Renato Leite Monteiro advogado

Renato Leite Monteiro é advogado sócio do escritório Baptista e Advogados

Ainda de acordo com o advogado, esse tipo de app é muito comum. “As pessoas querem uma diversão ou algo que parece inofensivo e, em troca, o app está criando um grande banco de dados biométricos e não se sabe com quem isso será compartilhado. Eles podem vender para empresas de análise biométrica, análise de fraude e até mesmo entidades públicas como autoridades policiais. O usuário precisa receber informações suficientes para saber para que o aplicativo vai usar esses dados. Na política da empresa, eles não dizem isso”, afirmou Monteiro.

Inteligência Artificial

Tecnologias envolvendo inteligência artificial vêm tendo um rápido desenvolvimento nos últimos anos. De acordo com reportagem publicada por Mobile Time sobre o tema, a IA vem despertando um debate sobre a importância de se estabelecer princípios éticos para seu uso.

Executivos brasileiros de empresas de tecnologia também acreditam que ética e inteligência artificial precisam andar juntas. Em discussão sobre o tema no Ciab Febraban 2019, realizado em meados de junho, Laércio Albuquerque, presidente da Cisco no País, afirmou que a IA vai facilitar a vida de todos, mas que a venda dos dados não pode acontecer.

Sobre o FaceApp

De acordo com seu site, o aplicativo russo FaceApp tem 70 milhões de usuários no mundo e, segundo a App Annie, assumiu a liderança em downloads nas lojas de app do Google e Apple na categoria foto e vídeo.

A Wireless Lab, empresa que produz o app, foi procurada por Mobile Time, mas não respondeu à reportagem.

Super Bots Experience

A 5ª edição do Super Bots Experience vai promover um debate sobre os princípios éticos no desenvolvimento de soluções com IA, com pontos de vista de um cientista (Marcelo Finger, chefe do departamento de ciência da computação e professor titular de inteligência artificial do IME-USP), um professor de direito (Eduardo Magrani, advogado, professor da FGV e da PUC-Rio) e uma juíza federal (Isabela Ferrari é do TRF-2 e coordenadora do instituto New Law). O seminário acontecerá nos dias 7 e 8 de agosto, no WTC, em São Paulo. Para conferir a agenda atualizada e mais informações sobre o evento, acesse www.botsexperience.com.br, ou ligue para 11-3138-4619, ou escreva para [email protected].

 

 

 

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