O governo do Piauí espera que, em 2025, o estado realize até 2 milhões de atendimentos de teleconsultas. A previsão foi dada pelo governador Rafael Fonteles (PT-PI), em evento organizado recentemente pelo Conselho de Transformação Digital do Piauí, o Geid-Poli, da USP, e contou com o apoio da entidade de sociedade civil Comunitas, em São Paulo. Em 2024, a média mensal de atendimentos digitais do estado foi de 100 mil.
“Nós percebemos que o grande gargalo na saúde é o acesso das pessoas ao médico para decidir o tratamento. Especialmente no interior do Brasil, o grande desafio é ter acesso ao médico especialista. O governo paga uma fortuna para um endocrinologista ir uma vez por mês fazer um mutirão, por exemplo. A transformação digital veio para resolver essa dor”, disse Fonteles, disse.
De acordo com o secretário de saúde do Piauí, Antônio Luz, a plataforma começou a ser testada em 2023, na cidade de Piripiri, a 165 km de Teresina. Em 2024, o uso da ferramenta expandiu para todo o estado (exceto a capital que não aderiu) e, atualmente, está em 202 municípios e em 1.169 Unidades Básicas de Saúde (UBS).
No final de outubro, o app Piauí Saúde Digital (Android, iOS) foi lançado para a realização de consultas diretamente no celular 24 horas por dia, sete dias por semana com um clínico geral. Atualmente, o aplicativo tem dez especialidades, o cidadão marca a consulta com a UBS e acessa o app no dia e horário para conversar com o médico especialista. O governador afirmou que o “grande disruptivo” da plataforma de saúde é fazer isso a um custo de “menos de US$ 1 por vida por mês”, o equivalente a R$ 10 milhões por mês ou R$ 120 milhões ao ano, em um orçamento total de R$ 1 bilhão por ano.
“Deixo de fazer financiamento e faço apenas uma troca de despesas. Antes entregava o dinheiro (R$ 8 milhões do orçamento) para o município gastar na saúde. Agora, entrego um serviço. Temos feito 100 mil procedimentos por mês. Para o próximo ano, a previsão é de 2 milhões de atendimentos no Piauí com consultas gerais e especializadas. E, com isso, montamos uma base de dados. Esses dados precisam ficar disponíveis para o paciente e para o sistema de saúde que vai atendê-lo”, completou Fonteles.
Embora Teresina não tenha aderido ao modelo, a plataforma está aberta para o cidadão fazer teleconsulta com o clínico geral, assim como pacientes de outros estados podem testar, pois o app não tem geolocalização. “Há vários relatos de pessoas que têm plano de saúde, entram no app, fazem a consulta, o médico passa o remédio (por WhatsApp), eles pedem via iFood e começam o tratamento em casa. Inclusive com pacientes de medicamentos crônicos que a receita vence”, completou Luz.
Integração de apps regionais com o SUS
Com o app integrado ao SUS, o secretário Luz explicou que a ideia é ter troca de informações para que o paciente do Piauí seja atendido em outros estados e vice-versa.
A secretária de Informação e Saúde Digital do Ministério da Saúde, Ana Estela Haddad, relatou que a construção da integração está em curso em todo País, mas não está pronta ainda e deve demorar mais de uma administração. Porém, o importante é ter começado: “Embora estejamos com 4,6 milhões de teleatendimentos, não estamos totalmente integrados. Integrar (o SUS) com um município é um desafio, integrar com um estado é um desafio maior. Integrar em um país continental do tamanho do Brasil não é só uma questão de escala, mas é uma complexidade também”, disse Haddad.
A especialista explicou ainda que o momento é de construir a interoperabilidade no ecossistema de saúde: “É o que estamos fazendo com a Rede Nacional de Dados e Saúde, que é a plataforma de interoperabilidade. Estamos participando do projeto International Patient Summary, um padrão para troca de informações baseado no regramento da OMS. Vamos permitir que o brasileiro tenha no QR code as suas informações básicas de saúde (medicamento e alergias, por exemplo) para quem atendê-lo no exterior”, disse.
Uma vez com a interoperabilidade criada, a integração entre o SUS e os estados será mais fluida e permitirá que o cidadão seja atendido em qualquer lugar do País e até do mundo – caso o país tenha os padrões de troca de dados do International Patient Summary e da OMS. A secretaria reforça que a ideia é trazer segurança na troca de dados e a continuidade do atendimento, uma vez que a consulta não pode ser isolada.
“A ideia é ter prontuário, exames e dados de saúde em um só lugar. Além do acesso, a integração permite a continuidade do cuidado, a qualidade e a resolução do problema”, disse Haddad. “Nós sempre dissemos que os dados são do cidadão. Pela primeira vez, estamos conseguindo trazer os dados de saúde para o paciente em seu celular”, completou.
A secretária aposta na integração entre os aplicativos regionais, como o do Piauí com o Meu SUS Digital, de modo que os dados circulem assim como a pessoa. Ou seja, quando um piauiense estiver fora do seu estado, ele poderá ser atendido sem gargalos pelo sistema em outro estado, a partir do compartilhamento de dados. E vice-versa, alguém de outro estado poderá ser atendido no Piauí sem intercorrências.
Mensageria
Na conversa, a secretária do Ministério da Saúde descartou avançar no uso de aplicativos de mensageria no momento. Em sua visão, a ideia é centralizar a relação com o paciente brasileiro por meio do Meu SUS Digital (Android, iOS): “Temos conversado com reservas sobre o uso do WhatsApp. É uma luta grande na saúde digital construir um modelo soberano no Brasil. A mensagem é uma coisa instantânea, objetiva, mas precisamos ter um trabalho estruturante”, disse.
Haddad explicou que, atualmente, o Ministério está fazendo campanha de alerta de dengue pelo Meu Sus Digital e campanha para aumentar os downloads do app: “Quanto mais ampliarmos o valor de uso, mais veremos downloads. Meu sonho é que possamos mandar todas essas notificações pelo SUS Digital”, completou.
Em contrapartida, o Secretário de Saúde do Piauí afirmou que o WhatsApp é importante para a comunicação com o cidadão. O problema é que a plataforma funciona apenas para o envio de informações e estudam como melhorar a relação de diálogo com os pacientes.
“O Saúde Digital Piauí é preparado para enviar mensagens por WhatsApp. Mas a nossa preocupação é avançar com a conversa bilateral, ou seja, mandar a mensagem e depois receber uma resposta. Não só para a parte da consulta, mas também para outras funcionalidades, como o cuidado pré-operatório e pós-operatório, por exemplo. No app é fácil de resolver. No WhatsApp é ruim ainda esse retorno”, disse Luz, ao afirmar que o alerta de consultas de pré-natal entrará no app e em plataformas de mensageria (WhatsApp, e-mail, SMS) para as pacientes.
IA na saúde do Piauí
Dentro do ecossistema digital de saúde do Piauí, o estado também pretende diminuir a fila de exames, inclusive com a demanda que deve surgir das consultas online. Com isso, a secretaria de Saúde prepara a construção de 16 centrais de exames, sendo que duas estão prontas e outras cinco estão prometidas para serem entregues até o final deste ano. A expectativa é que todas estejam em operação até abril de 2025.
“A ideia é que as pessoas não andem mais de 100 km para fazer exames de tomografia, mamografia, raio-x, ultrassom ou laboratoriais. Queremos integrar (digitalmente), reduzir o tempo e a distância física para fazer exames”, disse o secretário.
Luz afirmou que estão utilizando inteligência artificial integrados a alguns exames. Atualmente, se a pessoa vai a uma das 1,1 mil UBS que estão no Saúde Digital Piauí, 20% delas têm eletrocardiograma com IA.
“A pessoa faz o eletro, a IA detecta e alerta o médico se o paciente está com um princípio de infarto. Neste caso, é possível começar logo o tratamento ou encaminhar a pessoa para o hospital. Ou seja, a IA já ajuda o médico a salvar a vida da pessoa, a olhar com mais cuidado. Essa tecnologia pode ser integrada até em máquinas antigas (analógicas) das prefeituras e dá o laudo onde quer que o médico esteja”, concluiu.