O cliente pré-pago desbancarizado é o público-alvo do recém-lançado Claro Pay, serviço de conta digital da Claro. Para conquistá-lo, a operadora aposta no fato de conhecer sua jornada de recargas e ter contato com ele através de diferentes canais de comunicação, informa o diretor de serviços financeiros da companhia, Maurício Santos, em entrevista para Mobile Time. Para lançar o Claro Pay, a operadora precisou criar uma instituição de pagamento, provisoriamente chamada de NK 061, que está homologada junto ao Banco Central como participante indireta do Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI), revela o executivo. Com o Claro Pay, a empresa descarta, ao menos por enquanto, a ideia de uma carteira digital unificada com as outras teles.
Mobile Time – A abertura e a manutenção da conta digital do Claro Pay serão gratuitas? Como a operadora pretende monetizar?
Maurício Santos – Para pessoa física a conta digital é 100% gratuita. Não vai ter nenhuma tarifa, nem mensalidade. Estudamos talvez cobrar uma tarifa pelo saque em ATM. Estamos estudando isso para o lançamento para o público em geral em janeiro.
E para PJ, que não está disponível ainda, mas estará no começo de 2021, aí sim deve ter uma cobrança no recebimento de pagamentos. Mas essa tarifa, que é permitida, mesmo com o Pix, vai ser bem menor do que aquela que hoje o comerciante paga nas maquininha, o famoso MDR. E haverá vantagens. Hoje, no cartão de débito, o comerciante não recebe em tempo real, mas um ou dois dias depois. Com Claro Pay, usando o Pix, a liquidação é imediata.
Ainda sobre monetização, temos um projeto no forno: um cartão de crédito, mas não podemos divulgar o parceiro, que é um banco. Vai ser um cartão da Claro, com benefícios da operadora. Tudo o que a gente criar no Claro Pay vamos associar ao ecossistema digital da Claro, seja para oferecer benefícios exclusivos e incentivos para usar o Claro Pay, seja para utilizar a inteligência de dados. Por exemplo, o programa de fidelidade da Claro em breve vai ser associado ao Claro Pay.
Temos um produto de crédito pessoal, o Claro smartcred, lançado ano passado, que será atrelado ao Claro Pay. Outro serviço que já existe e que será associado ao Claro Pay é o de antecipação de crédito de recarga.
A monetização do Claro Pay, portanto, virá através do atendimento a PJs e da oferta desses serviços financeiros adicionais. No crédito pessoal temos acordo de divisão de lucros com banco Inbursa. Na antecipação de recarga temos taxa de conveniência. No cartão de crédito será divisão de lucro. E planejamos outros serviços em parcerias com bancos e fintechs, como outras formas de crédito, não somente crédito pessoal, talvez focando no cliente pré-pago. Temos no pipeline investimentos, câmbio, educação financeira, contabilidade virtual, financiamento de aparelhos, dentre outros.
Clientes de outras operadoras vão poder abrir uma conta no Claro Pay?
Sim, da mesma forma como é feito com o Claro Música, Claro Video, Claro Drive etc. O serviço vai estar disponível para todos os clientes, de todas as operadoras e categorias de telecom (pré, pós e controle).
Mas o foco principal é no segmento pré-pago, correto?
Entendemos que existe uma camada da população que é muito mal atendida pelos bancos grandes e que tem “match” com o público pré-pago das operadoras. São pessoas que não têm conta em banco ou, se têm, retiram todo o dinheiro e não transacionam eletronicamente, mas possuem celular pré-pago. É um tipo de cliente para o qual a Claro tem um diferencial competitivo importante. Conhecemos bem esse cliente, pois temos uma relação de longo prazo e recorrente com ele. É gente que faz recarga mensal, semanal, ou até diária conosco. Temos um canal de relacionamento com ele, seja por SMS ou push notification, ou nas lojas próprias e no atendimento telefônico. Entendemos a jornada desse cliente e suas necessidades. Em parceria com bancos vamos oferecer serviços para esse público.
Vimos o crescimento do app Caixa Tem junto a esse público, em função do auxílio emergencial, mas muitos dos usuários ficam esperando ansiosamente a data do saque para poder tirar o dinheiro. Muitos geram boleto para mandar o dinheiro para outra carteira digital e sacar antes da data. Ou seja, ainda não se conseguiu bancarizar de fato esse público. São 40 milhões de pessoas. Elas não enxergam valor, ou ainda têm receio de bancos, gostam de trabalhar com dinheiro. É preciso entender sua necessidade. E ter um produto simples, fácil, com benefícios para incentivá-las a usar serviços financeiros digitais. Essa é a proposta principal de valor do Claro Pay.
O banco Inbursa, parceiro de vocês no Pix, aparece na lista de participantes diretos do Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI) como “liquidante especial”, não como provedor de conta transacional. Quem vai fornecer a conta do Claro Pay?
Será a própria Claro Pay. Somos um participante indireto do Pix, mas com o nome de NK 061, veículo legal que criamos para essa finalidade. Como somos uma instituição de pagamento nova, ainda não pudemos nos conectar diretamente ao Pix. Para isso usamos o banco Inbursa.
Uma das vantagens das operadoras celulares no Pix é o fato de controlarem a ativação de novos chips celulares. Pretendem oferecer o Claro Pay para os novos clientes da Claro já com o número cadastrado como chave Pix?
Uma das grandes guerras do momento é o cadastro da chave Pix. Porém, o sucesso de uma conta corrente ou de pagamento não está na sua abertura, mas no estímulo ao seu uso. Só se consegue estabelecer um relacionamento com o cliente se houver uma frequência de depósito na conta, o que pode ocorrer em dinheiro e cada vez mais vai acontecer através do Pix. Antigamente se pagava a empregada doméstica em dinheiro, com retirada no ATM. A partir de agora, o patrão vai fazer um Pix. E uma das chaves principais será o número celular. Então, o cadastro da chave é fundamental para ter dinheiro na conta. A gente vai usar todos os ativos que a Claro dispuser para isso. Quando o cliente ativar o chip poderá receber comunicação sobre Claro Pay. Se comprar celular novo, o Claro Pay virá pré-instalado. Se comprar em loja da Claro, vamos ensiná-lo a abrir conta e cadastrar a chave. Mas a gente não pode cadastrar a chave pelo cliente, porque existe um processo definido pelo Banco Central que precisa ser seguido. O que faremos é escolher o momento certo da jornada do cliente para oferecer o download do app, a abertura da conta digital e o cadastro da sua chave Pix.
Esse público está acostumado a usar dinheiro. Quando paga contas, enfrenta fila em lotérica. A conta digital traz a conveniência de pagar tudo pelo celular, incluindo recargas e transferências. Esse processo de educação do cliente com certeza está no escopo da Claro. Sem dúvida, temos uma vantagem competitiva em relação a outras carteiras digitais ou mesmo aos bancos tradicionais.
O lançamento do Claro Pay significa que a Claro não vai seguir a proposta da TIM de desenvolver uma carteira digital única pelas quatro teles para clientes pré-pagos?
Acompanhamos as declarações do Labriola e do Ciuchini sobre isso. O Gruner, da vivo, e a Oi também comentaram. Se há alguma negociação entre as operadoras, a gente não poderia comentar, porque estaria protegido por NDAs.
Mas posso dizer que a estratégia da Claro hoje é o Claro Pay. Não temos intenção de fazer algo com as outras operadoras neste momento. Acabamos de lançá-lo e é nele que vamos investir.
Contudo, esse mercado está mudando muito, em velocidade muito rápida. Pix é só o primeiro passo a permitir a entrada de outros players em pagamentos. O open banking começa agora em novembro e abre interoperabilidade com troca de informações. A competição vai se reconfigurar… A gente não descarta possibilidade de parcerias no futuro. Vai depender da dinâmica do mercado. Mas, reitero, hoje a nossa estratégia é com o Claro Pay.
O que mudou em relação ao passado, quando as operadoras tiveram outras experiências em serviços financeiros que não foram bem sucedidas?
Vivo Zum, Meu Dinheiro Claro, Tim Multibank Caixa e Oi Paggo não foram bem sucedidas na época, na nossa visão, por uma questão de tecnologia. Esse foi o principal fator. A interface via USSD e SMS tinha usabilidade muito difícil para público desbancarizado. Esse cliente tem baixa instrução. 8% da população é analfabeta. E 22% é semianalfabeta. Para esse público, o serviço tem que ser mais intuitivo e simples. Às vezes a pessoa não consegue nem ler a mensagem. Nessa nova onda, com app, muita gente já tem smartphone e sabe usar apps e QR codes. Outro ponto que se discutia na época era a falta de interoperabilidade. Só dava para transferir dinheiro de Vivo Zum para outro Vivo Zum. Esse problema não existe mais com o Pix.
Sobre cobrar uma tarifa para saque em ATMs, isso ficará mais barato quando o Banco Central implementar o saque Pix no varejo, certo?
Sim. O saque Pix vai ser muito mais barato porque vai ter uma competição muito maior. Todo varejista passará a ser um ATM, teoricamente. E eles vão praticar seus preços livremente. O mercado vai se regular através da competição. O BC está fazendo um trabalho excepcional em aumentar a competição.
Além disso, temos pedido ao BC a criação do depósito Pix, para usuários que quiserem depositar em dinheiro não dependerem de agências.
Quantas contas do Claro Pay espera que sejam abertas em 2021?
Temos projeções e um plano de negócios de cinco anos, mas não podemos abri-lo. Posso dizer que a ambição é grande, com foco no cliente pré-pago e controle das classes C, D e E.
Algum plano para atrair o cliente pós-pago?
O Claro Pay vai conquistar esse cliente com alguns benefícios. Para atender público das classes A e B teremos parcerias com outros bancos e fintechs. Está no nosso radar. Entendemos que é um cliente mais exigente. Dificilmente ele vai tirar dinheiro de sua conta-salário com um dos cinco grandes bancos tradicionais para investir em um banco digital, seja de quem for. Acreditamos que para essa camada de renda superior, parcerias são fundamentais para chegar na proposta de valor. Não será uma wallet simpels que vai convencer esse cliente.