O fim das redes 2G e 3G no Brasil deve chegar em cinco anos na visão dos fornecedores de tecnologia para operadoras e smartphones. Contudo, os fabricantes de celulares e equipamentos com essa conectividade pedem mais tempo, pois há uma porção considerável de consumidores que ainda utilizam essas redes.
De acordo com estudo publicado pela GSMA no começo de dezembro, o 2G cairá de 10% para 1%, limitado basicamente a soluções de comunicação máquina-a-máquina (M2M, na sigla em inglês) até 2025. E o 3G, que hoje corresponde a 15%, desapareceria do País, com os dispositivos migrando para 4G ou 5G.
Em conversa com Mobile Time, executivos de Qualcomm, MediaTek, Huawei, Nokia, Positivo Tecnologia, Multilaser e Philco explicaram como veem o possível desligamento do 2G e 3G pela ótica do relatório da GSMA.
Redes
Para Carlos Roseiro, diretor de soluções integradas da Huawei no Brasil, há desafios para a migração. Um dos problemas é o fato de que parte do serviço de voz está no 2G e no 3G. Para o especialista, o ideal é migrar para a base de voz VoLTE. “Hoje tem operadoras mais avançadas que conseguem migrar para o VoLTE com melhor qualidade de som e eficiência do uso de espectro maior. Outras ainda não”, disse Roseiro.
O outro desafio é o M2M, em especial o parque de máquinas de cartão. Para o executivo da Huawei, o parque precisa evoluir “do 2G para 3G e do 3G para 4G”. Lembra ainda que as operadoras que fizeram desligamento das redes no exterior avisaram aos clientes com antecedência (vide Telefônica na Espanha).
Na visão de Wilson Cardoso, CSO da Nokia no Brasil, o 2G deve ter uma sobrevida mais longa que o 3G por causa da base M2M. O diretor da fornecedora finlandesa acredita que uma alternativa para o GSM seria migrar a base de dispositivos M2M para o NB-IoT. No 3G, Cardoso vê uma mudança natural e mais rápida, um movimento acelerado principalmente pelo mercado de smartphones recondicionados.
Celulares
Do outro lado da disputa estão os fabricantes de feature phones e dispositivos 2G e 3G. Os três principais fabricantes desses celulares explicam que a demanda ainda é alta no Brasil, por serem produtos baratos. Inclusive, os executivos de Multilaser, Philco e Positivo disseram em uníssono a mesma frase: “enquanto houver demanda, nós continuaremos fornecendo.”
Para Fabiano Favero, gerente de produtos da Multilaser, a expectativa é que a definição de desligamento das redes aconteça apenas em 2023. Explica que 90% da demanda de vendas ainda é de feature phones 2G e 3G: “Nós vemos o desligamento do 2G e do 3G pontual em algumas regiões. Mas precisamos avisar às operadoras e elas religam a rede, pois há demanda”, completou, sem dizer o nome das empresas.
Por sua vez, Cristiano Carvalho de Freitas, diretor de negócios de mobilidade da Positivo, lembrou que o estudo da GSMA indica que 11% das conexões virão de feature phones em 2025. Afirma ainda que o “refarming pode ser mais complexo” para 4G e 5G, devido à possível necessidade de ampliar a rede de fibras, por exemplo. Vale lembrar que a fabricante nacional também produz maquininhas POS com a marca Quantum.
Rafael Sczcepanik, coordenador de desenvolvimento de produto e engenharia da Philco, afirma que há planos para trazer VoLTE aos seus feature phones. Contudo, o executivo pede um estudo e esforço da Anatel para fazer essa migração, uma vez que há demanda e pessoas conectadas ao 2G e 3G.
“Sempre há a tendência de novas tecnologias tomarem o lugar das antigas. Entretanto, no Brasil ainda existem muitos terminais utilizando as tecnologias 2G e 3G. E será necessário um certo esforço da Anatel em conjunto com as operadoras para realizar a migração destes usuários para o 4G ou 5G”, disse Sczcepanik. “As novas tecnologias precisam de espectro para ampliarem sua abrangência. Mas é importante realizar estudos para não desampararem usuários de tecnologias 2G e 3G durante esta migração”.
Processadores
Pelo lado dos fornecedores de chipsets, Samir Vani, country manager da MediaTek no Brasil, explica que, por um lado, a companhia aposta na democratização do 5G e pretende levar chipsets para camadas de preços mais baixos. Por outro, a sua empresa seguirá fornecendo processadores 2G e 3G para atender a demanda dos fabricantes.
“Eles (chips 2G e 3G) continuam no portfólio, principalmente o 3G. E, obviamente, o volume é pequeno. Mas não trabalhamos muito com esses chips, são voltados mais para mercados específicos”, relata Vani. “O nosso caminho está claro nos investimentos do 5G. Estamos trabalhando para que não se restrinja aos produtos mais caros. Trazemos uma série de chips para a gama do intermediário”, explicou Vani.
O líder local da MediaTek diz ainda que a “diferença de preço não é tão grande” entre chips 3G e 4G. Com isso, não vê sentido no consumidor pagar R$ 50 a menos para ter um telefone 3G. Da mesma forma, acredita que os fabricantes optarão cada vez mais pelo 4G: “Talvez diminuindo custo e lucro, mas ele será obrigado a fazer a migração”, concluiu.
Já Hélio Oyama, diretor de desenvolvimento de negócio da Qualcomm, afirmou que, embora não tenha virado estratégia da empresa, é natural a migração da produção de chipsets: “Não anunciamos de forma oficial. Mas comunicamos essa estratégia para os produtos 5G. Temos várias famílias de 5G, da série 800 a série 400. Temos vários produtos com Snapdragon 765. Anunciamos a série 600. E inclusive na série 400 suportamos 5G com os primeiros lançamentos comerciais no começo de 2021. Nossa estratégia é massificar o 5G. Para o usuário final, ela é uma estratégia bem-vinda com aparelhos mais acessíveis”, concluiu.
Preço
Um ponto criticado pelos fabricantes é o custo de produção dos handsets. Alinhados, os executivos de Multilaser, Philco e Positivo acreditam que o desligamento repentino e o foco em 4G e 5G aumentaria o preço dos produtos. “Se tivesse só 5G, não seríamos competitivos. Se acelerar o 5G, o mercado será consolidado em poucos players. Mas é uma discussão que aconteceu lá atrás (do 3G para o 4G), é uma questão de transição até 2025”, disse Favero. “Hoje, o produto 5G é muito mais caro, pois não tem oferta de entrada. O investimento é no topo da pirâmide. Se não tivesse 3G e 4G, o tíquete médio ia mais que dobrar”, estima Vani.
Por sua vez, Sczcepanik, da Philco, explica que, inicialmente, os produtos com tecnologias recentes tendem a ter valores superiores. Contudo, acredita que a massificação dos equipamentos baseados nas tecnologias 4G e 5G trará uma tendência de estabilização em um patamar mais baixo de preços. Cita como fator positivo a remoção de componentes relacionados as tecnologias 2G e 3G, que poderiam contribuir na redução do custo.