Carlos Mira, CEO do TruckPad (Android), acredita que não haverá uma greve nos mesmos moldes da paralisação de 2018. Embora a empresa tenha realizado uma pesquisa que revelou que a maioria dos caminhoneiros brasileiros adeririam a um movimento grevista no País, o executivo entende que o momento atual é bem diferente daquele de dois anos antes.
“Em 2018 tinha um reajuste diário de combustíveis. Naquela época, o caminhoneiro começou a se organizar e muitos estavam tendo contato com o WhatsApp pela primeira vez”, explica o gestor. “Hoje, eles recebem informação o dia todo. Mas filtram mais informações que em 2018. Naquela época, eles filtravam menos”, avalia Mira.
O CEO da plataforma afirma que precisaria de uma organização sindical “muito forte” que estivesse presente em postos de gasolina nas estradas brasileiras, fazendo o corpo a corpo com os motoristas, algo que não existe hoje. Mira lembra ainda que ameaças parecidas surgem a cada dois anos, mas não avançam. A história recente mostra que o Brasil teve apenas duas paralisações, em 1999 e 2018.
Mas, se ocorrer a greve, o executivo do TruckPad acredita que a adesão se espalharia rapidamente: “A tendência é: se acontecer, alastra. E isso pode determinar o lockdown da economia nacional”, completou.
Problemas
Mesmo acreditando que não haverá greve, Mira reconhece que há problemas no setor de frete rodoviário. Em sua visão, há muitos caminhoneiros para poucos fretes. Isso causa uma disputa comercial entre eles. Além disso, o cenário é agravado com empresas que oferecem o frete abaixo da tabela.
Com isso, o CEO do TruckPad explica que em muitos casos “o preço do frete não cobre o ativo” do caminhoneiro, como custo com combustível, manutenção e insumos. Mira pede uma ação mais enérgica do governo na fiscalização do preço do frete através da tabela. E clama para que o ministro e presidente do STF, Luiz Fux, determine se a Política de Preços Mínimos dos fretes é inconstitucional ou não (ADI 5956).
Contudo, o executivo lembra que houve sinalizações favoráveis do governo federal aos caminhoneiros, como:
- a definição pela ANTT do preço mínimo do frete de cargas rodoviárias, normativa publicada no Diário Oficial da União na última quarta-feira, 19;
- a promessa do presidente Jair Bolsonaro de zerar imposto na importação de pneus para o setor;
- e o comprometimento do ministério da Infraestrutura de adicionar os caminhoneiros como grupo prioritário na vacinação contra o novo coronavírus.
Pneus e balança comercial
Um capítulo à parte na reclamação dos motoristas, os pneus passam por um momento de alta variação nos preços. Na última quinta-feira, 14, o presidente Jair Bolsonaro prometeu em live que zeraria a taxa de importação deste produto, a maioria fabricado na China. Para Larry Carvalho, advogado e árbitro com vasta experiência em litígios e ênfase em transporte marítimo, o fato de a tarifa ser zerada ajudaria o setor, compensando os custos devido ao desabastecimento do produto.
Tal desabastecimento tem como motivo uma “tempestade perfeita” no segmento de frete e logística marítimos em razão da crise do novo coronavírus. Esse momento único reduziu a quantidade de navios para fazer o transporte deste tipo de carga; houve falta de contêineres, que ficaram parados por muito tempo nos portos; e a logística rodoviária e marítima global não está 100% atuante, uma vez que muitos países da Europa voltaram a adotar o lockdown.
Como resultado, o setor de transportes teve alta de quase 700% na locação de contêineres. Por exemplo, no Ceará, o valor saltou de US$ 1,4 mil para US$ 11 mil, na comparação ano a ano. Dito isso, o advogado afirmou que o problema da falta de produtos, como o pneu, deve continuar em 2021.
“A demanda está tão grande (no setor de transporte marítimo) que você tem uma dificuldade dos importados na volta dos contêineres (da China para o ocidente). Agora, as empresas de frete marítimo evitam importar produto de baixo valor agregado”, afirmou o especialista.
Governo e classe
Procurado pelo Mobile Time, o Ministério da Infraestrutura informou que há “uma agenda permanente de diálogo” com as principais entidades representativas da categoria por meio do Fórum do Transporte Rodoviário de Cargas (TRC), além de reuniões constantes com suas lideranças.
“O restabelecimento do fórum, desde 2019, tem sido o principal canal interativo entre Governo e o setor. Qualquer associação representativa que deseje contribuir para a formulação das políticas públicas pode requerer a sua participação para debater eventuais temas de interesse da categoria”, completa a nota do Minfra.
Por sua vez, a Confederação Nacional do Transporte (CNT), entidade setorial que representa 27 federações e quatro sindicatos do setor: “A CNT não tem informações sobre a possível greve e, por isso, não podemos nos manifestar a respeito”.