No dia 28 de outubro de 2021, o Facebook mudou o nome de sua holding para Meta. A alteração ganhou destaque não pelo rebranding – de uma marca que estava sendo criticada por reguladores, sociedade civil e rivais –, mas pelo conceito que foi apresentado nesta nova fase da companhia: o metaverso.
Este conceito virou mantra de cada líder e executivo de empresa nos últimos seis meses. E paraceram companhias dizendo que entraram ou até criaram o seu próprio metaverso antes mesmo da Meta. Embora o próprio Zuckerberg tenha dito que o metaverso é “uma jornada de cinco a dez anos” para se realizar, as empresas correram para surfar nessa onda. Contudo, a realidade é bem diferente. A população desconhece o que é o metaverso. Segundo uma pesquisa recente da NordVPN, 55% dos norte-americanos disseram que não sabem do que se trata e apenas 14% explicaram o que é.
Para destrinchar esse buzzword e separar o que é mito e o que é realidade, Mobile Time conversou com especialistas de finanças, marketing, educação, TIC, para entender o que é o metaverso, quais são os impactos, os casos de uso e como se preparar. Na primeira matéria desta série, vamos abordar o real conceito do metaverso.
Uma definição inicial desta nova fronteira da tecnologia pôde ser vista no relatório da área de pagamento do JP Morgan. O banco explica da seguinte forma:
“O metaverso é uma convergência sem barreiras das vidas digital e física, criando uma comunidade unificada e virtual onde as pessoas podem trabalhar, relaxar, transitar e socializar. O metaverso está nos primeiros passos de sua evolução e não há uma definição singular que as pessoas possam se guiar. Temas do que o metaverso é e o que pode ser, no entanto, estão crescendo. Um ponto-chave é que não será um único mundo virtual, mas vários mundos, que estão tomando forma para garantir que pessoas usem e estendam suas interações sociais digitalmente. Isso é feito ao adicionar uma camada 3D à web para criar experiências mais autênticas e naturais”.
Contudo, como o JP Morgan diz na análise, não há uma definição única de metaverso, portanto, é preciso voltar para trás e entender um pouco como chegamos até aqui.
Web3
De uma maneira mais simples, Fernando Moulin, partner na Sponsorb e professor na ESPM, explica que o metaverso é a evolução da Internet, a Web3, cujo principal alicerce é a descentralização das informações e maior controle por parte do usuário.
“Tem um elemento crucial com a evolução da Internet: ela é uma adolescente recém-formada na faculdade. Quando surgiu essa Internet era web 1. Cadê e Altavista eram páginas travadas ou repositórios de dados. A web 2 é o social, são as plataformas, o mecanismo orquestrado, que transformaram essas empresas que lideram a Internet hoje”, recapitula Moulin. “O que estamos vendo na Web3 é uma descentralização do mundo anterior. Serão vários mundos. Vários ambientes virtuais. O protocolo do blockchain vai possibilitar que os criadores de conteúdo trabalhem em ambientes virtuais”, completa.
Moulin, que atua ainda como professor e conselheiro da IBRAMERC da Live University, afirma que o desafio no metaverso será em interconectividade. Ou seja, o trafegar de avatares/identidades digitais em empresas privadas e redes com autônomos que devem criar seus metaversos, como Meta, Adobe e Microsoft: “A interneconectividade permitirá acesso ao metaverso com devices como VR, AR e celular. Será a integração das tecnologias que temos hoje”, conclui.
Recentemente em evento da Accenture, o criador da world wide web original, Tim Berners-Lee, disse que o metaverso é sobre “encontrar pessoas” em espaço virtuais. O pesquisador explicou que a diferença é o que muda agora com a evolução da Internet para Web3. Haverá a mudança das informações e comunicações guiadas por áudio e texto para outras mídias, como vídeo e as realidades virtual, aumentada e mista: “Agora temos muitas mídias e nós podemos transitar entre elas”, diz.
Filmes e livros
Guilherme Moika, consultor em engenharia de software do CESAR, lembra que o metaverso não é um conceito novo. Recorda que começou nos anos 1990 e foi explorado em livros (Ready Player One) e filmes (Matrix), mas só não avançou por limitações técnicas. O consultor acredita que as empresas começam a avançar por meio de tecnologias inovadoras, como o blockchain, que permite descentralizar as transações e trocar informações em uma rede.
“Metaverso é um conceito que se baseia no nosso universo real e o metaverso (virtual). É como se fosse um segundo universo, mas não é desconectado. Ele tem a conexão com o mundo real muito forte”, detalha Moika.
Moika explica que a ideia por trás desses universos é que tenha união entre serviços e plataformas. Por isso, se ficar sozinho, o metaverso da Meta não será diferente de experiências anteriores que não deram certo, como Second Life.
“Metaverso não é só um serviço O2O. O que veremos entre os marcos são as possibilidades tecnológicas. Anos atrás (no Second Life) tínhamos uma interação virtual que tinha a ideia do Metaverso. Era uma experiência virtual que trazia contexto, mas era uma ferramenta isolada. Não era um universo ligado ao metaverso. A grande diferença que vejo entre o passado e o futuro é a tecnologia. Acesso a software e hardware robusto com alta conectividade e baixa latência”, explica.
Momento
Michael Biltz, diretor da Accenture, afirmou que estamos em um momento inicial do metaverso. Mas justamente por estar no começo, as empresas que querem entrar nesses universos podem se preparar com antecedência: “2022 é o ano em que vamos olhar para os próximos dez anos. A realidade é que o metaverso será muito fragmentado. Seja Meta, Fortnite, Myriad: serão diferentes universos e as empresas precisam entender com quais precisam interagir e quais papéis querem ter (fornecedor, aplicativo de serviço ou concorrente)”, prevê.
Moika, do Cesar, acredita ainda que estamos bem longe da visão de Zuckerberg de termos metaversos em cinco a 10 anos. Em sua análise, o consultor acredita que há tecnologias isoladas que impulsionam esses universos, como realidade aumentada e virtual. Mas o problema é que essas tecnologias são incipientes perto da promessa de união entre virtual e físico.
“O metaverso (em seu estágio mais avançado) incluirá hologramas, por exemplo. É essa a ideia de entrar no mundo virtual, mas conectado com o físico. São coisas que ainda não exploramos. Hoje, nada do que fazemos no virtual repercute diretamente no que fazemos no real. Não sei se chegaremos tão rápido. E precisaremos de players no mercado mundial para fazer experimentações isoladas”, disse. “Não sei se cinco a dez anos é o suficiente. Precisamos de tecnologia, testar, errar, até dar certo e disseminar e entender o que é a proposta do metaverso”, diz o consultor do CESAR.
Mais otimista é Moulin, da Sponsorb. Em sua visão, as tecnologias avançadas de realidade aumentada e virtual demorarão de “três a cinco anos para ficarem massivas”. Mas acessar o metaverso sem necessidade de devices avançados – como PCs e smartphones, como defendeu Zuckerberg na apresentação de seu metaverso –, o consultor acredita que demorará de 10 a 15 anos.
“O que está acontecendo é que o avanço do machine learning pode achar soluções mais fáceis. Como aconteceu com as vacinas da Covid-19 e todo o processo de informação e interações mais rápida entre os cientistas ao redor do planeta”, completou Moulin, ao lembrar que a Meta investiu pesado em um supercomputador com inteligência artificial para acelerar o desenvolvimento de aplicações no seu metaverso.