O início das sanções da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), em agosto de 2021, fez com que o Brasil entrasse de vez para o rol de países que contam com uma legislação específica para proteção de dados e da privacidade dos seus cidadãos. Apesar de ser uma evolução e tanto, a lei ainda tem suas lacunas e desafios.
De acordo com a agenda da ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), para 2022, constam os quatro seguintes pontos a serem detalhados em regulamentação: direitos dos titulares; encarregado de proteção de dados pessoais (DPO); transferência internacional de dados pessoais; e hipóteses legais de tratamentos de dados pessoais. “A tecnologia vai dar uma celeridade muito grande para o usuário neste ano. As operadoras sabem que este é um assunto vivo, que sempre teremos que ter novas ferramentas”, diz Waldemar Gonçalves, diretor da ANPD.
“Nesse caso de transferência de dados, ou seja, fluxo internacional de dados, há uma grande questão de como vai ser a estruturação disso. Quais são as cláusulas padrão para seguir nos contratos? Todo mundo quer saber para existir segurança jurídica. Isso depende da regulação da ANPD”, pontua Christian Perrone, coordenador da área de direito e tecnologia, Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio).
Especificações sobre os direitos dos titulares e ainda sobre os encarregados contratados nas empresas para atuar como canal de comunicação, os chamados DPOs, seguem vagos, e também dependem de regulação em 2022.
LGPD Penal
Entretanto, o principal desdobramento da LGPD é a chamada LGPD Penal, que as entidades do setor aguardam para 2022 – apesar de não haver sinalização de avanços neste tema nem no Congresso, nem na ANPD.
A LGPD Penal é um anteprojeto de lei criado por juristas para regular o tratamento de dados na esfera criminal. “Quando a gente fala da LGPD Penal ela vem com o objetivo da aplicação dos parâmetros e critérios da LGPD no âmbito da segurança pública e das investigações penais. Considero um grande remédio para garantir esse equilíbrio entre o tratamento dos dados nas atividades policiais sem que elas firam o direito à liberdade individual”, analisa Raphael Dutra, sócio do PDK Advogados. “A LGPD, no artigo 4, diz que precisa de um ponto sobre a criminalização. A lei manda que exista uma nova lei. Portanto, ela é necessária. Saiu uma proposta de texto no Congresso, mas ele ainda nem entrou em discussão formal”, completa Perrone.
A LGPD Penal pode não ter saído do papel, mas já é polêmica. Perguntada por Mobile Time sobre o assunto, a ANPD informou que ainda não tem uma posição oficial. Já o Ministério Público se posicionou contra o anteprojeto, afirmando que “pode dificultar a investigação e o combate a crimes no Brasil, além de comprometer os esforços do País na cooperação para enfrentamento à criminalidade internacional”.
Segundo Dutra, o incômodo gerado é que o texto limitaria a capacidade de investigação do ministério. Um dos pontos mais criticados, por exemplo, são as restrições ao uso de IA para reconhecimento facial. “Para usar o reconhecimento, o MP teria que obter autorização judicial para evitar abusos. Há estudos que concluem que a maioria desses sistemas têm mais chances de identificar rostos negros ou asiáticos”, explicou. “O desafio da LGPD Penal é: como construir uma norma que não inviabilize o trabalho policial e garanta a confiança entre o cidadão e o Estado”.
Pelas projeções de Perrone, para 2022, contudo, talvez não haja espaço para a LGPD Penal na agenda. “Com as eleições, haverá uma série de discussões na ANPD sobre crimes eleitorais. Este flanco pode permanecer aberto”, completa.