O governo federal pediu para que o Cade faça um levantamento sobre os impactos dos planos oferecidos por operadoras de telecom a seus clientes que oferecem o zero rating para determinados aplicativos – sem o uso da franquia de dados do cliente – e a associação entre as empresas de telefonia móvel com as plataformas, em especial Meta, dona dos apps mais explorados neste tipo de plano, como o Facebook, o WhatsApp e o Instagram.
O pedido é fruto do processo instaurado por entidades que integram a Coalizão Direitos na Rede (CDR) no dia 4 de janeiro, como Idec, Intervozes, Nupef e Iris. O encontro ocorreu com representantes da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) e da Secretaria para Assuntos Digitais, vinculadas ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, e da Secretaria de Políticas Digitais, vinculada à Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), no fim da tarde desta quarta-feira, 25. Entre os presentes estavam: Estela Aranha (Secretaria de Direitos Digitais), João Brant e Samara Castro (Secretaria de Políticas Digitais); Ricardo Lovatto Blattes e Vitor Hugo do Amaral (Senacon).
A CDR apresentou pedidos às secretarias para que o governo adote medidas regulatórias para adequar os planos de acesso à Internet móvel à legislação vigente. As entidades defendem que o bloqueio do serviço ao fim do pacote de dados e a oferta de planos pré-pagos com franquias associadas a zero rating – o não uso do plano de dados móveis do usuário –, é ilegal, porque a lei prevê que o acesso à Internet é um serviço essencial, assim como o de água e luz, e, como tal, deve ser prestado continuamente e deve ter seu acesso garantido pelo Estado a toda população.
A CDR e seus parceiros pedem a revisão do modelo de negócio das operadoras e que seja reconhecida a ilegalidade dos planos com zero rating, uma vez que ele fere a neutralidade da rede e desrespeita o princípio de descontinuidade de um serviço essencial.
“Foi estratégico esperarmos o resultado das eleições para conversar com o governo porque o Lula disse expressamente que ia acabar com o limite de acesso à Internet. E essa é uma discussão que a Coalizão tem há muito tempo, contra planos com franquia e zero rating, desde 2015, quando as operadoras mudaram seus planos de negócio”, explica Flávia Lefèvre, advogada e representante da CDR, em conversa com Mobile Time.
“O que acontece é que assim que acaba o pacote de dados da pessoa, a Internet é bloqueada e ela só acessa os aplicativos zero rating, que geralmente são o Facebook e o WhatsApp”, continua Lefèvre.
À época do anúncio do processo instaurado, a advogada comentou que, no Brasil, existe a Internet dos ricos e a Internet dos pobres. Enquanto os ricos têm a banda larga fixa, os pobres não têm. “A franquia de dados do pré-pago por mês não dá para fazer nada. Não dá para ver um filme, não dá para assistir às aulas online. Nós questionamos esse modelo pré-pago. Se a lei diz que é um serviço essencial para a cidadania, e serviço essencial não pode ser interrompido, como admitir que a cidadania de uma pessoa fique restrita à sua capacidade econômica? A renda média no Brasil é de R$ 2,5 mil por pessoa. Mas 50% da população vive com até R$ 450 por mês. Não tem condição de garantir que uma pessoa exerça sua cidadania plenamente se não se garante que ela tenha um acesso digno e sem limites à Internet. Hoje, para fazer inscrição no Fies, para conseguir auxílio emergencial e para acessar mais de 1,5 mil serviços públicos você precisa estar conectado. Na pandemia isso ficou muito evidente”, argumentou à época.
A Senacon e a Secretaria de Assuntos Digitais se comprometeram em apresentar o resultado de levantamentos realizados pelo Cade daqui a 30 dias, em uma nova reunião com o grupo.
“Foi muito positiva a reunião. Estamos otimistas. A questão é complexa e não vai se resolver da noite para o dia. A estrutura física que temos impacta o modelo de negócios desses planos. Mas o que me deixou otimista foi que eles reconheceram a urgência do tema”, completa a advogada.