O Brasil conta com uma grande quantidade de integradores de TI, mas poucos especializados em redes celulares privativas 4G e 5G. Essa carência atrapalha o crescimento do mercado, pois integradores poderiam contribuir na captação de clientes e na liderança de projetos. 

Mobile Time conversou sobre a questão com representantes de sete empresas que atuam nesse ecossistema. Embora a maioria confirme o problema, há divergências na hora de detalhá-lo. A falta de conhecimento técnico sobre redes 4G e 5G por parte dos integradores é a queixa mais comum, mas há reclamações também sobre a falta de experiência em negócios.

Para começo de conversa, é preciso esclarecer a própria definição de “integrador”. “Diferenciamos integrador de instalador. O instalador só instala, segue as regras do manual. O integrador faz o papel de inteligência”, propõe Daniel Blanco, gerente de inovação da Furukawa. 

Na KPMG, por sua vez, é feita uma distinção entre o integrador de tecnologia, responsável por garantir que todas as peças de um projeto estejam conectadas devidamente e operando a contento, e o integrador de negócios, também chamado de “orquestrador”, que tem uma função que se assemelha àquela de um consultor, desenhando projetos de redes celulares privativas com aplicações que entreguem maior produtividade e eficiência para o cliente. Integrador de redes celulares privativas com conhecimento em negócios é o que mais falta no Brasil, aponta Dustin Pozzetti, sócio e head de consultoria no Brasil e América do Sul da KPMG. Seu colega Eduardo Pereira, sócio-diretor da KPMG Brasil, concorda: na sua opinião, muita gente se posiciona como integrador de tecnologia, mas poucos conhecem o negócio do cliente.

Marco Szili Telesys

Marco Szilli, da Telesys: “Faltam integradores no sentido verdadeiro da palavra: o cara que levanta o problema, desenha a solução e traz tudo o que for necessário, desde o regulatório até o serviço”

Nesta matéria, vamos tratar como integrador aquele que mescla tanto conhecimento técnico quanto de negócios para liderar projetos de redes celulares privativas em 4G e 5G. É esta figura que Marco Szilli, sócio-fundador da Telesys, quer encontrar com mais frequência no Brasil: “Faltam integradores no sentido verdadeiro da palavra: o cara que levanta o problema, desenha a solução e traz tudo o que for necessário, desde o regulatório até o serviço”.

O integrador ideal

Para liderar um projeto, o integrador precisa ser capaz de desenhar uma rede celular privativa levando em conta aspectos técnicos e de negócios. O planejamento, aliás, é crucial para o sucesso da iniciativa. É preciso, antes de mais nada, entender para quê o cliente quer uma rede celular privativa e obter respostas para algumas perguntas básicas: quais aplicações e que tipos de dados vão rodar nessa rede?; são aplicações que exigem baixa latência e alta velocidade?; é uma operação de missão crítica ou não?; qual a área a ser coberta pela rede?; é indoor ou outdoor? As respostas ajudam a definir qual frequência e tecnologia utilizar em cada projeto. Depois, é necessário vistoriar a área onde ficará a rede, mapeando obstáculos que afetem a propagação do sinal e definindo a melhor localização para a instalação das antenas.

É preciso também assessorar o cliente na escolha dos fornecedores de equipamentos de rede, CPEs, módulos de IoT, core de rede, e desenvolvedores de aplicações, assim como executar a instalação e a interconexão de tudo. 

Além disso, o integrador pode oferecer uma atuação fim a fim, abrangendo a operação, a manutenção e o suporte à rede celular privativa depois de implementada.

Aventureiros causam fracassos

A experiência com redes de outras tecnologias, como Wi-Fi, não é suficiente para ser um integrador de uma rede celular privativa, porque os padrões de 4G e 5G têm peculiaridades que requerem conhecimento técnico profundo e específico.

Tom Araújo, diretor comercial da Celplan, alerta para o surgimento de aventureiros tentando cumprir o papel de integrador: “Vivemos um momento perigoso. Havia poucos integradores de redes celulares privativas. E agora surge muita gente se apresentando como integrador, mas são empresas que faziam, por exemplo, radiocomunicação em VHF e que agora falam que integram 4G e 5G, mas não têm experiência com as bases dessa tecnologia. E aí surgem alguns Franksteins.” 

O que o executivo chama de “Frankstein” são redes celulares privativas mal planejadas, que acabam dando errado. E aí consultorias e integradores mais experientes são convocados para resolver o problema. Há vários relatos sobre esse tipo de situação. 

“Temos sido chamados por gente que prometeu e não cumpriu. Ou que começou um projeto e desistiu. Há também alguns mais antigos que instalaram uma rede celular privativa e depois perceberam que operar é difícil e muito caro”, conta Cristiano Moreira, gerente de produtos da Embratel.

A KPMG conta sobre uma vez em que constatou que a modelagem do caso de uso estava errada, o que resultou em um desenho equivocado de toda a arquitetura da rede, tornando necessário refazer inclusive a localização das antenas e o dimensionamento dos recursos de computação para processamento dos dados. 

O CTO da Celplan, Thiago Zanin, recorda de outro exemplo. ”Teve um caso de agronegócio no qual nos defrontamos com problemas fortes de projeto. O sistema já estava instalado e fomos convidados para ajudar. Analisamos os dados e percebemos que no mínimo a instalação estava mal feita. Depois entendemos que premissas importantes haviam sido deixadas de lado. Se tivéssemos participado do planejamento, teríamos escolhidos outros sites para as antenas. Como já estava tudo instalado, nosso limite era de otimização física e lógica. Calibramos nosso software e fizemos um ajuste fino para salvar a rede”, relembra. Mas nem sempre isso é possível. “Já enterramos três projetos de redes privativas nos últimos anos”, conta seu colega Araújo, da Celplan.

Fabricantes, operadoras e consultorias

Na falta de integradores especializados em redes celulares privativas, sobra para fabricantes, operadoras e algumas consultorias de renome internacional cumprirem esse papel, como Deloitte e KPMG. Mas, em geral, esses atores preferem projetos de grande porte, com orçamentos na casa de dezenas ou até centenas de milhões de Reais. Ou então projetos mais complexos e que tragam visibilidade midiática, por conta da empresa contratante e/ou da sofisticação do caso de uso. A verdade é que a maioria dos fabricantes e das operadoras prefeririam formar parcerias com integradores capazes de captar clientes para que possam focar em seu core business, ou seja, na venda de equipamentos, no caso dos fabricantes, ou na operação da rede, no caso das teles.

“Grandes fabricantes têm estrutura para grandes contas e grandes clientes. Mas a expectativa é de que esse mercado de redes celulares privativas seja pulverizado. Então, é importante para eles contar com a capilaridade de canais de venda e integradores com know-how de tecnologia. O mesmo vale para as operadoras, avalia Samuel Lauretti, diretor comercial da Trópico.

“Não queremos ser integradores porque não temos braço para tudo. E se eu conseguir ter parceiros integradores, meu volume de vendas será maior do que se eu vendesse direto. Nossa estratégia é vender através de integradores”, diz Szilli, da Telesys.

Uma exceção é a Embratel. A operadora conseguiu desenvolver um portfólio de produto “de prateleira” para redes celulares privativas. A empresa se posiciona como uma “habilitadora” de projetos desse tipo.

CristianoMoreira Embratel

Cristiano Moreira, da Embratel: “A gente empacotou (as redes celulares privativas). Simplificamos para conseguirmos escalar”

“A gente empacotou (as redes celulares privativas). Simplificamos para conseguirmos escalar. E agora meu time de vendas consegue conversar de igual para igual com as empresas que nos procuram. A gente conversa sobre redes privativas por metro quadrado e com determinada capacidade em Mbps. Assim, desde o CEO até o estagiário de TI entendem”, descreve Moreira, da Embratel. A tecnologia (4G ou 5G) e a frequência escolhidas dependem da densidade da rede, da área a ser coberta e da capacidade necessária. O modelo de negócios é cobrar como serviço, ou seja, Opex em vez de Capex. 

Verticalização dos integradores

Hoje, as empresas que atuam como integradores de redes celulares privativas cuidam de projetos dos mais variados setores, do agronegócio à mineração, de distribuidoras de energia à indústria 4.0. Porém, é esperado que com o passar do tempo surjam integradores especializados por vertical. Isso deve acontecer em razão do conhecimento técnico, pois cada vertical demanda aplicações e redes com características diferentes, mas também por causa de uma especialização comercial, ou seja, por saber se relacionar e falar a mesma língua de um determinado setor, o que facilita a venda de um projeto.

Pereira, da KPMG, acredita que possa haver inclusive a especialização de integradores em subverticais. Ele argumenta, por exemplo, que na agricultura as aplicações são muito diferentes dependendo da cultura. E o mesmo acontece na indústria.

Outro possível caminho é que haja integradores especializados em redes celulares privativas de missão crítica e outros para redes que não tenham essa característica. “Acho natural surgirem integradores mais especializados em redes de missão crítica, que requererem metodologia melhor, equipamentos de testes melhores etc”, comenta Araújo, da Celplan.

Treinamento

A solução para a falta de integradores especializados em redes celulares privativas pode estar no treinamento e capacitação de técnicos de empresas que hoje desenham redes de outras tecnologias. “Talvez aquelas que trabalham com outras tecnologias sem fio, como Wi-Fi, sejam boas candidatas. Mas, de todo modo, é uma mudança grande”, comenta Lauretti, da Trópico.

Órgãos de governo, universidades e fabricantes de equipamentos podem contribuir nesse processo. “Iniciativas de agências brasileiras de fomento, como ABDI, Suframa e de instituições de ensino e pesquisa, como Senai, Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), PUC e Instituto de Desenvolvimento Tecnológico (INdT) têm tido papel fundamental no compartilhamento de conhecimento e na construção de casos de sucesso que possam ser replicáveis”, lista Renato Bueno, head de vendas para indústrias digitais na América Latina da Nokia. 

O executivo da Nokia cita as iniciativas do Senai Open Lab em São Paulo e São Caetano do Sul, quando foi instalada na instituição uma rede privativa 4G, depois atualizada para 5G. “Desde então, vêm-se desenvolvendo tecnologias e processos em parceria com toda a cadeia de automação industrial. É fundamental perceber que uma iniciativa como esta tem efeito multiplicador, ao possibilitar a capacitação de profissionais, a criação de testes de casos de uso e a integração de equipamentos de diversos fabricantes em um único e controlado ambiente”, avalia Bueno.

O surgimento de novos integradores especializados em 4G e 5G pode ser o catalisador que falta para o mercado de redes celulares privativas deslanchar no Brasil, aliado a outros fatores já existentes: barateamento de equipamentos, oferta de um cardápio de frequências pela Anatel para autorizações de Serviço Limitado Privado (SLP) e busca por transformação digital em setores diversos da economia nacional.

Mapa de Redes Celulares Privativas e MPN Fórum

Mobile Time publicará em breve o primeiro mapa do ecossistema brasileiro de redes celulares privativas, servindo como uma fotografia desse segmento. E no dia 12 de julho acontecerá em São Paulo, no WTC, a terceira edição do MPN Fórum, seminário organizado por Mobile Time sobre esse mercado. A programação inclui um painel sobre o papel dos integradores no desenvolvimento do mercado de redes celulares privativas. Estão confirmadas no MPN Fórum as participações de:

. Alexandre Gomes, diretor de marketing da Embratel

. Ciro Faccini, engenheiro sênior de telecom da CPFL

. Dustin Pozzetti, sócio e head de consultoria no Brasil e América do Sul da KPMG

. Igor Calvet, presidente da ABDI

. Marcio Veronesi, diretor de vendas enterprise Brasil da Nokia

. Marco Szili, sócio-fundador da Telesys

. Maria Teresa Lima, diretora executiva para governo da Embratel

. Nilson Monteiro, diretor de desenvolvimento e gestão portuária do Porto de Suape

. Paulo Humberto Gouveia, diretor de soluções corporativas da TIM

. Ricardo Pence, vice-presidente de vendas para America Latina, Espanha e Portugal da Baicells

. Samuel Lauretti, diretor comercial da Trópico

. Tom Araújo, diretor comercial, Celplan

. Vinicius Caram, superintendente de outorgas e recursos à prestação da Anatel

. Virgilio Fiorese, head de redes privativas sem fio da Amdocs

A programação completa e mais informações estão disponíveis em www.mpnforum.com.br

 

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