Anualmente, a Apple promove o WWDC (World Wide Developers Conference), em São Francisco, nos Estados Unidos, conferência criada para apresentar aos desenvolvedores as novidades que a empresa vem desenvolvendo e que serão lançadas nos próximos meses. A ideia é equalizar o conhecimento e acelerar a adoção dessas tecnologias nos aplicativos para Macs, iPhones e iPads. O evento começa, oficialmente, em uma segunda-feira, se estendendo por toda a semana. Mas, todo 'applemaníaco' chega no domingo, a tempo de pegar o seu crachá e seguir para a sede da empresa, em Cupertino, para comprar souvenirs da marca, como camisetas, bonés e canecas, na única loja oficial do planeta em que se vende esses produtos.
Nos últimos anos, por causa do sucesso do iOS (iPhones e iPads) a conferência tem se tornado um evento concorrido. Em 2010, a empresa vendeu os 5 mil ingressos em uma semana. Em 2011, os ingressos se esgotaram em oito horas e, este ano, um novo recorde foi batido – ao preço de US$ 1,7 mil cada, as entradas se esgotaram em uma hora e 43 minutos. Nesse cenário, não dá para não se sentir meio afortunado por conseguir comprar um desses "golden tickets".
A abertura da WWDC é quase um evento à parte, começando às 10 da manhã com uma apresentação de duas horas, onde o CEO da empresa e uma série de vice-presidentes mostram um pouco do que será falado na semana, os rumos da companhia e alguns lançamentos. Essas também são as únicas duas horas em que a imprensa pode participar da conferência. As filas começam por volta das duas da manhã, se estendendo aos arredores do centro de convenções até às oito, quando as portas são abertas e a fila migra para dentro do recinto.
Este ano, a visão de 5 mil pessoas circulando de uma sala para outra durante os cinco dias de conferência foi algo assustador. A infraestrutura montada, porém, deu conta do recado. A Apple fez questão de trazer funcionários das Apple Stores de toda a região para coordenarem filas e auxiliarem os participantes, e como todo funcionário de uma Apple Store, eles eram sempre educados, brincalhões e pacientes, como se estivessem se divertindo tanto quanto os participantes da conferência.
O evento excedeu as minhas expectativas. Além de inúmeras sessões com um volume imenso de conteúdo, havia mais de mil engenheiros da Apple à disposição para responder dúvidas técnicas, mostrar detalhes de implementação e dar sugestões de alterações de código, além de uma equipe de designers prestando consultoria particular para quem quisesse (e conseguisse agendar um horário). E a troca de experiências entre os conferencistas foi a cereja do evento.
Notei uma quantidade enorme de desenvolvedores independentes e pequenas start-ups. Os próprios ganhadores do Apple Design Awards, prêmio dado a aplicativos que se destacaram em critérios de design e inovação, eram na sua maioria de empresas pequenas, com dois ou três profissionais, que gastaram um ou dois anos transformando um sonho em um sucesso. Mesmo assim, encontrei desenvolvedores de companhias como a Mastercard, Universal Studios, Disney, entre outras, que estavam ali absorvendo tudo para disseminar junto aos seus times.
Todas as informações absorvidas na conferência, com exceção da abertura, estão sob acordo de confidencialidade, assinado na compra do ingresso e que impede os participantes de divulgarem o conteúdo da WWDC. Por isso, o restante da conferência fica em segredo até que os recursos divulgados sejam lançados. Mas a conferência apresentou grandes evoluções na parte de software, tanto para os Macs quanto para iPhones e iPads, e prova que a Apple continua no caminho de tornar seus produtos poderosos e simples de usar, inclusive para os desenvolvedores.
Ao final da conferência, a Apple deixou claro que inovação, atenção aos detalhes e o foco em criar os melhores produtos para "o resto de nós" está no DNA da empresa, e também no coração e na mente de seus funcionários. Muitas das apresentações técnicas tiveram esse enfoque, e durante as conversas com engenheiros e designers da marca, o mesmo discurso apareceu. Mais que um legado, o que Jobs criou e aperfeiçoou na Apple continua lá e deve permanecer por muitos anos ainda.
Provas disso não faltam. Durante a abertura, a empresa lançou um novo notebook, o MacBook Pro retina, que traz uma tela com resolução inédita, se livra do gravador de DVDs e do disco rígido convencional. A atenção aos detalhes está no sistema de resfriamento da máquina, que utiliza ventiladores com pás assimétricas, para que o ruído seja mais bem distribuído, quase extinguindo o barulho da máquina, mesmo em situações de alto processamento.
A integração quase invisível do novo sistema operacional para Macs e dos sistemas para iPhones e iPads com o iCloud é outra prova do foco da empresa no usuário comum, no "resto de nós". A integração permite que o usuário compartilhe fotos, músicas, livros, aplicativos e documentos entre os diversos dispositivos sem esforço.
Ao longo dos anos, diversos funcionários que deixaram a Apple criaram outros produtos, para nichos específicos, com os mesmos conceitos que a Apple prega e aplica. Um dos criadores do iPad lançou este ano, nos Estados Unidos, um termostato para ar condicionado central, chamado iNest. E o que era um produto simples e comum se tornou quase um sonho de consumo para proprietários de casas. Além de ser controlado como um iPod, o equipamento permite o ajuste de temperatura através de iPhones e iPads, mesmo fora de casa, e contém um sistema voltado a 'entender' os hábitos da casa e criar uma programação adequada, a fim de economizar energia e manter a casa na temperatura correta. Esse tipo de mentalidade, essa quebra de paradigmas é a essência da Apple e é algo que está dentro de cada funcionário da empresa.
Tudo indica que a companhia continuará criando produtos que desafiam os concorrentes, e os críticos da empresa continuarão balbuciando especificações técnicas para provar que o produto X ou Y do concorrente é melhor, sem perceber que o que faz da Apple uma empresa diferente não são os componentes eletrônicos usados, a frequência de seus processadores ou a tecnologia de seu sistema operacional. O que faz da Apple a Apple é a integração, a atenção aos detalhes e o foco preciso no consumidor. É a paixão dentro de cada funcionário em fazer o melhor para o consumidor, a melhor experiência, da embalagem à tela de configuração. É não comprometer o produto que está sendo desenvolvido para atingir um prazo ou um preço.