O surgimento das lojas de aplicativos móveis, como App Store e Google Play, proporcionou a desenvolvedores de qualquer porte e dos seis continentes uma distribuição mundial. Porém, ao mesmo tempo, gerou um intrincado problema de ordem tributária: para quem devem pagar os impostos sobre o seu faturamento? Em seu país, no país onde está o servidor da loja ou no país onde está seu consumidor? Nos EUA, o IRS, equivalente à nossa Receita Federal, está de olho em desenvolvedores móveis estrangeiros, que vêm acumulando um significativo passivo tributário naquele país. A maioria desconhece a dívida que tem com o governo norte-americano e só descobre quando precisa montar um escritório nos EUA ou realizar algum negócio por lá.
Tanto a Apple quanto o Google reportam ao IRS a lista de desenvolvedores com faturamento anual acima de US$ 20 mil em downloads ou vendas in-app nos EUA. Todos os listados passam a ser acompanhados pelo IRS. Além disso, para repassar o dinheiro, Apple e Google exigem que o desenvolvedor tenha um EIN (Employer Identification Number), equivalente ao CNPJ brasileiro. Ao buscarem ajuda local para criar seu EIN, os desenvolvedores estrangeiros acabam descobrindo sobre o passivo tributário. A Drummond, empresa que presta consultoria contábil, tributária e legal para empresas brasileiras e americanas nos EUA, informa que a procura por parte de desenvolvedores móveis brasileiros cresceu 20% em um ano. "Nenhum que nos procurou tinha um passivo grande. A maioria estava começando a exportar serviços e deu para fazermos um planejamento. São apps diversos, alguns utilitários, outros de entretenimento. Mas nenhum jogo até agora", relata Carolina Cunha, consultora tributária da Drummond.
Pela legislação norte-americana, são necessárias duas condições para que um desenvolvedor móvel estrangeiro precise pagar impostos sobre seu faturamento lá: 1) o download do conteúdo (seja do app em si ou de bens virtuais dentro dele) precisa ter acontecido nos EUA; 2) é necessário haver presença física do desenvolvedor nos EUA. O problema é que o IRS tem uma compreensão bastante abrangente do que configuraria "presença física". Basta haver algum tipo de propaganda da empresa ou do seu aplicativo exibida nos EUA ou ao alcance de usuários norte-americanos para ficar caracterizada a presença física. Em tese, por exemplo, o banner promovendo o download de um jogo brasileiro, se exibido dentro de outro app no smartphone de alguém nos EUA poderia ser considerada "presença física". Carolina cita o caso de um app brasileiro que é associado a uma agência de viagens que, por sua vez, fez propaganda do aplicativo nos EUA: "nesta situação, estava mais do que clara a presença física".
O destaque de apps estrangeiros na versão norte-americana da App Store e da Google Play é uma situação mais complicada. Como esse destaque geralmente é feito por uma curadoria interna das lojas, sem pagamento por parte do desenvolvedor para ter seu app ali exibido, talvez não seja o suficiente para caracterizar presença física. "É um assunto mais delicado, pode ser quer o IRS entenda que sim ou que não. Mas se houver pagamento por parte do desenvolvedor pelo espaço, não há discussão", diz a consultora.
São cobrados impostos federais, estaduais e municipais. Os dois últimos dependem do local onde estão os consumidores que baixaram o conteúdo. As alíquotas federais variam de 25% a 34% para empresas com renda tributável anual entre US$ 50 mil e US$ 10 milhões. Acima desse limite, se aplica uma alíquota com nova tabela, a partir de 35%. Os impostos estaduais e municipais variam de 0% a 15%. Tudo o que for pago nos EUA pode ser debitado do imposto sobre exportação de serviço a ser pago no Brasil, garante Carolina.