Os drones são os novos aliados dos agricultores brasileiros. Esses pequenos robôs voadores registram imagens das lavouras para serem analisadas por softwares capazes de identificar a presença de pragas ou outros problemas, como deficiência nutricional na plantação, estresse hídrico e falhas no plantio. Tudo é georreferenciado, permitindo uma resposta precisa, mesclando defensores químicos e controle biológico. O problema é que os drones custam caro, com valores variando de aproximadamente R$ 10 mil a mais de R$ 500 mil. Isso sem contar o custo do software de análise de imagens, o que restringe seu uso a agricultores de médio e grande porte. Para levar os drones aos agricultores familiares, foi firmada uma parceria entre Embrapa, Qualcomm e o Instituto de Socioeconomia Solidária (Ises), com o lançamento do Programa de Desenvolvimento de Tecnologias para o Uso de Drones em Agricultura de Precisão, anunciado nesta quinta-feira, 30, na unidade da Embrapa em São Carlos/SP.
"O custo do drone em si e do processamento de dados é muito alto para o pequeno agricultor. E, no Brasil, a maioria dos agricultores são de pequeno porte", comentou o presidente da Qualcomm para a América Latina, Rafael Steinhauser, durante a cerimônia de lançamento.
A proposta é ter uma primeira prova de conceito de um drone de baixo custo para agricultura de precisão em maio do ano que vem. A ideia é que parte do processamento das imagens possa ser feita em tempo real pelo próprio drone, aproveitando um processador embarcado da Qualcomm, e enviado via 4G para um smartphone ou tablet do agricultor. O protótipo será testado ao longo de dois anos por um grupo de agricultores familiares selecionados pelo projeto. Depois disso, espera-se já ser possível lançar comercialmente uma solução que englobe tanto o drone quanto os softwares a um preço próximo de R$ 5 mil. Para que seja acessível aos pequenos agricultores, provavelmente será necessária a oferta de um modelo de negócios de "drone como serviço", prevê Lúcio Jorge, coordenador das pesquisas com drones na Embrapa.
Cada empresa participante da parceria tem um papel bem definido no projeto. A Embrapa entra com os softwares de análise de imagens, cujos algoritmos são desenvolvidos por ela mesma. A Embrapa já conta com softwares sofisticados para a identificação de problemas em culturas de grãos, especialmente milho e soja, e vai estender para outros tipos de plantações, com foco nos pequenos agricultores.
A Qualcomm, por sua vez, traz a sua experiência no desenvolvimento de componentes do hardware. A companhia norte-americana tem um módulo chamado Snapdragon Flight, voltado para drones, que consiste em uma pequena placa com 23,2 cm2 reunindo diversas funcionalidades, como processador, GPS, câmera 4K, GPU etc. O Snapdragon Flight aproveita processadores criados pela Qualcomm originalmente para smartphones, mas seu GPS é cinco vezes mais veloz que aquele dos celulares, por causa da necessidade de enorme precisão de localização durante um voo.
O Ises ficará encarregado da análise do impacto sócio-econômico dessa iniciativa sobre o setor de agricultura familiar. "É uma grande oportunidade para entendermos os benefícios da tecnologia na agricultura. Queremos aproximar o homem do campo à tecnologia", disse Marcela Cardo, sócia-diretora do Ises.
O projeto é financiado pela Qualcom Wireless Reach. O valor investido não foi divulgado. "Queremos democratizar o uso de drones, de forma a trazer benefícios em escala para todos", resumiu Oren Pinsky, diretor de novos negócios da Qualcomm no Brasil.
Ajustes finos
Atualmente, o processamento das imagens coletadas pelos drones é feito offline. Depois do voo, as fotos são recuperadas em um cartão de memória e analisadas em computadores. A geração de um mosaico com e a análise das imagens pode levar muitas horas, dependendo do tamanho da área. Para que esse processo seja feito em tempo real pelo próprio drone, será necessário fazer uma série de ajustes e testes para chegar à melhor relação possível de resolução de câmera e confiabilidade da análise feita pelo software embarcado. Para determinadas aplicações, não é necessária uma resolução altíssima, por exemplo. Esses ajustes finos serão realizados ao longo do projeto. Possivelmente, dependendo da aplicação, parte dos dados coletados serão enviados pelo drone para um servidor externo realizar o processamento e enviar depois para o agricultor.
O Snapdragon Flight conta com uma câmera 4K, que consegue gerar uma resolução de até 10 cm2 de uma plantação. Dá perfeitamente para identificar falhas no plantio e realizar a contagem de plantas. A câmera pode trazer sensores multiespectrais, como infravermelho e ultravioleta, que permitem a identificação de determinadas pragas. Se forem acoplados lasers, dá para medir a altura das plantas e estimar a quantidade de frutos. E com uma câmera termal o agricultor consegue saber também a hora certa de irrigar cada parte da sua lavoura.
Números da agricultura familiar
Hoje, 70% dos produtos agrícolas consumidos no Brasil provêm da agricultura familiar. Ao todo, há 4,1 milhões de unidades produtivas de agricultura familiar no País, que empregam 74% dos trabalhadores da agropecuária nacional. Trata-se, contudo, de um segmento que enfrenta sérios desafios. Cardo, do Ises, cita algun deles: sistemas produtivos onerosos, trabalhosos e imprecisos; baixa escolaridade; dificuldade de acesso a recursos; dificuldade no beneficiamento, armazenamento e transporte dos produtos; e exposição a atravessadores.